Impiedoso, o sol rachava a terra. A dorzinha no estômago fazia a menina arrastar seu irmão. Apressavam o passo, as vistas escureciam. Paravam por minutos e voltavam a correr pela estrada poeirenta.
Todos os dias a estrada se espicha na volta. Era um não acabar mais de poeira, mato seco e fome. Iam calados. Com a boca seca era difícil falar. Também não tinham o que dizer. A vida deles era sempre a mesma peleja.
Maria acordava de madrugada, arrumava a farinha de mandioca com rapadura e chamava o irmão. Comiam e pegavam a estrada. Iam para a escola na vila.
Todos os dias eram alvo das chacotas dos colegas. No recreio, comiam o feijão de olhos baixos fingindo não escutar as risadas dos colegas.
Depois da aula, pegavam a estrada de volta. Havia um roçado esperando por eles. Plantação de mandioca de onde saía a farinha que os sustentava. O que aprendiam na escola parecia morrer com a quentura do sol na cabeça.
De vivo só aquela dor crescendo na barriga. E a certeza que comida decente só teriam no dia seguinte. Na escola.
Obs: A autora é mineira. Formada em- Letras pela UFMG, pós-graduou-se na UEMG em Administração Escolar. Às vezes é prosa, outras, poesia. Participou de várias coletâneas, Livro da Tribo, revistas e jornais literários, impressos e virtuais, com poemas, crônicas e contos. Publicou três livros de poesia pela Editora Penalux: Equilibrista (2016), Pontiaguda (2017), Náufraga (2018). Nesse ano, 2020, publicou seu primeiro livro de contos – O Insuspeitável perigo do instante-beijo e outros contos –