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Não sei qual foi a repercussao nos jornais do sul e do sudeste nesse 1o de maio.
Falo pelo que li nos jornais aqui de Pernambuco.
O General Mourão fez uma Live com o Itaú.
Disse que a ação do Estado na Pandemia é só um protagonismo excepcional em função da crise, mas que logo isso vai cessar. O Estado não seguirá como agente econômico ativo.
Para o General Vice-Presidente o rombo nas contas públicas chegará a uns R$ 600 bilhões e logo após 2020 deveremos voltar às reformas e às políticas de ajuste fiscal. Algum espanto nessas declarações? Não.
O que nos conforta é que não estamos em quarentena nas cavernas, mas em casa, aqui e ali com razoável acesso à internet, portais sociais, de sindicatos, de órgãos públicos, como IBGE, Tesouro Nacional, Banco Central, Câmara, Senado e Universidades.
E aí o bicho pega.
A fala de Mourão é o texto de Guedes proferido em língua portuguesa.
É o mantra do capital rentista traduzido de outros idiomas.
É o sonho de consumo dos mercados, dos credores da dívida pública, dos bancos.
Aliás, atenção, os bancos estão ávidos pela aprovação da PEC 10/2020 que permitirá ao Banco Central lhes comprar cerca de R$ 1 trilhão em papéis podres, fazendo para isso mais dívida publicar, seguindo o formato definido nos dias 1 e 2 de outubro de 2019 na Global NPL , reunião ocorrida em Londres com bancos e agentes financeiros graúdos de todas as partes dó mundo, todos preocupados pois tais papéis nao lhes estavam pagando rendimentos e com a COVID-19 isso iria se alastrar.
Já vimos esse filme após 2007/2008/2009.
Socializacao dos prejuízos e privatizacao dos lucros.
Quem gostar de cinema assista ” Inside Job”, traduzido aqui para ” Trabalho Interno’.
No Brasil a dívida pública deixou de ser, há décadas, meio complementar de financiar o Estado e suas obras de infraestrutura para ser financiada pelo próprio Estado, leia-se, pela maioria da sociedade submetida a uma tributação regressiva e indireta ( ” dívida em si não é problema, o problema é para que foi feita, o que produz e que encargos financeiros gera “, disse Carlos Lessa na CPI da Dívida Pública da Câmara Federal em 2010).
Em 2019 as necessidades de financiamento do setor público ( em busca do obsessivo equilíbrio receita-despesa ) bateram a casa dos R$ 740 bilhões 95% dos quais referentes aos encargos da própria dívida e aos passivos do Banco Central nas operações de swap cambial.
Em 2016 aprovou-se a EC 95, para se criar ” um novo regime fiscal” a fim de se obter ” a sustentabilidade da dívida pública”. Estava escrito no texto da PEC 241, que gerou a EC 95/2016.
Essa é a lógica por trás do nexo Estado-Financas ( Harvey – A Loucura da razão econômica, 2018).
Esse governo está irritado com os gastos feitos fora do roteiro eleito em 2018 e quer nos cobrar com juros, muitos juros e austeridade os gastos lentos e mal feitos até aqui contra o Coronavirus e nas precárias condições de assistência aos desempregados (Austeridade para quem? nos perguntaram Belluzzo, e Pedro Paulo Zaluth Bastos em ótima coletânea, em 2015/Carta Maior ).
Pela boca de Guedes o mote agora é congelar por dois anos os salários dos ” parasitas “, digo, dos servidores públicos pois já estão em casa com a geladeira cheia. Das duas uma: Ou filou e colou muito na faculdade de Economia e na pós em Chicago ou desaprendeu.
Salário é consumo, demanda, tarifas públicas e para as concessionárias. Impostos e contribuições sociais embutidas em tudo que se paga. Grana que volta ao privado e às receitas dos governos.
Já os juros e amortizações da dívida pública (R$ 560 bilhões em 2019) não voltam às cadeias produtivas de bens e serviços nem engordam receitas públicas concentrando riqueza nas mãos dos rentistas. A dívida pública, como uma varinha de condão… Já disse o velho Marx.
Então já sabemos o que nos espera após a COVID-19.
Mais arrocho salarial, mais precarizacao de direitos para o trabalhador da esfera privada, mais sangria do tesouro para a dívida publica, seus juros e amortizações.
Nenhum aprendizado a favor do SUS ou da assistência social pós-pandemia.Por eles, Bolsonaro, Mourão, Guedes, Itaú, Bradesco, Santander, nada de reforçar o orçamento da Seguridade Social. A meta é manter a sustentabilidade da dívida como proporção do PIB para não tornar o Estado ” insolvente” e vender o máximo de papéis podres de suas carteiras ao Banco Central.
O roteiro eles já traçaram em 5/11/2019 quando mandaram ao Congresso as PECs 186, 187 e 188. Essa última torna a dívida pública como âncora fiscal do Estado no texto comstitucional.
Estado mínimo pra maioria da sociedade. Estado forte e máximo para o capital.
Os investimentos sociais e na infraestrutura que se danem. Assim mesmo, sem nenhum arrodeio para dizer o que querem.
Estamos, portanto, atrasados na preparação pro embate. Agora mesmo as Centrais Sindicais não se manifestaram ainda à altura frente a PEC 10/2020.
Nenhuma análise descendo pras bases, nenhuma denúncia bem explicada como estão fazendo a Maria Lúcia Fattorelli e a Auditoria Cidadã.
Quem não leu a nota da Auditoria acerca da PEC 10/2020 vai no site e baixa. Escandalosamente um grande negócio pros bancos e agentes financeiros gerando mais dívida pública, concentração de riqueza, pobreza e desigualdade.
Então, vamos à luta.
O estágio atual do capitalismo, acúmulo de décadas, não aceita um novo Bretton Woods, como em 1944. Iludem-se os que pensam assim sonhando que tudo será como antes a partir de 2022, com o ” desenvolvimentismo” dos anos de 2003/2014, com a ” nova classe média” , as políticas de transferência de renda dialogando à mesa com um capitalismo franciscano.
Aprendemos muito nesses anos.
A hora é de enfrentamento, de denúncia desse barbárie, de acúmulo de forças no campo e na cidade para que a ruptura esteja cada vez mais próxima.
Sim, amanhã vai ser outro dia, pois a vida devia ser bem melhor e será.
Me organizando posso desorganizar.
Abraços.
Obs: O autor é professor e Mestre em Educação pela UFPE
Foi Deputado Federal da Comissão de Seguridade Social e Família, autor da Emenda que destinou 50% do fundo dos royalties do pré-sal para a educação e saúde em 2013
Criador e 1º. Coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção (2004)
Na Câmara Federal foi autor da PEC 162, propondo o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano.