É assim que começa o famoso poema do poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade. Ele o escreveu para flagrar a situação de perplexidade, interrogação, angústia e insegurança, resultantes da constatação clara de que terminou uma situação anterior, e pela frente não se sabe o que nos aguarda.
É tão pungente o clamor expresso pelo poema que nos sentimos tentados a prosseguir sua leitura.
“E agora, José,
a festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, você.”
E por aí segue o poema do grande escritor.
Mas se agora evocamos sua obra prima, é certamente porque nos vemos mergulhados em situações semelhantes àquelas que o poema explicita.
Nós também estamos perplexos pelo que está por acontecer, depois de terminadas as antigas seguranças. Daria para citar a angústia de quem constata que o crédito acabou, a reserva sumiu, o tanque esvaziou, o carro enguiçou e os amigos se foram.
“E agora, José”
Ou poderíamos nos lembrar do concílio, do sínodo, das grandes conferências continentais. Já levam a marca do passado, do que “já era”, do que já se foi.
Havia tantas expectativas diante do Sínodo sobre a família. O sínodo acabou. “E agora, José?”.
Aos poucos precisamos dar-nos conta que também o Concílio está ficando num tempo passado, está entre o que já se foi, já era, pois agora estamos em outra.
No próximo mês de dezembro, a Igreja fará o último gesto de reconhecimento da importância do Concílio, celebrando, no dia 8 de dezembro, os 50 anos do seu encerramento festivo, ocorrido em 1965.
Este gesto será a última bênção reservada ao defunto, antes de ser respeitosamente sepultado? Ou será a confirmação de que o Concílio ainda continuará sendo “a bússola que vai iluminar os passos da Igreja no início do terceiro milênio”, como disse João Paulo II, na encíclica “Tertio Millenio Ineunte”?
Em todo caso, depois de 50 anos, é forçoso constatar que o Concílio terminou! Ou, ao menos, que a era do Concílio já se foi.
“E agora, José?”
Parece que o momento nos alerta para deixar de lado utopias superficiais, expectativas gratuitas, caminhos fáceis. Pela frente, se apresenta o horizonte carregado de nuvens que nos deixam inseguros sobre o que virá, se será a chuva esperada, ou tempestades com ventos e granizo.
E não deixa de ser elucidativo constatar que em algumas redes sociais se chega a difundir a versão de que o Concílio foi “coisa do diabo”, e em seu lugar se assume a postura contrária, de rejeição de tudo o que o Concílio suscitou na Igreja.
Para muitos agora o chique é “ser tradicionalista”, é ser contrário ao Concílio, fazer tudo o que se fazia antes, porque isto agora pega bem, afaga o ego, dá alegria!
O concílio acabou, o sínodo terminou, os palpites acabaram.
“E agora, José”?
04.11.15
Obs: O autor é Bispo Emérito de Jales.