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Aprendemos desde criança a cumprimentar as pessoas com quem nos relacionamos, primeiramente com um informal ‘oi’, depois, mais crescidos, com os habituais ‘bom dia’, ‘boa tarde’ e ‘boa noite’.
Conversando com gente mais vivida, tomei conhecimento de que, antigamente, pronunciar esses cumprimentos era algo que vinha realmente do coração. Mais do que um simples gesto de gentileza, era o desejo de que a outra pessoa tivesse realmente um ‘bom dia’, por exemplo.
Com o tempo, o que era desejo passou a ser mera cortesia e esta, por sua vez, passou a ser uma formalidade qualquer, de tal maneira que muitas vezes nem nos damos conta de quem estamos cumprimentando, pois nem sequer olhamos nos olhos um do outro. Assim, o então ‘bom dia’ acabou reduzindo-se num ‘… dia’, a fim de tão somente se cumprir uma imposição social.
Há cerca de quinze dias, eu estive no ‘IMP – Instituto de Mama de Piracicaba’, acompanhando uma pessoa muito próxima, que se recuperou de procedimentos cirúrgicos e tinha uma consulta marcada. Quando lá cheguei, cumprimentei as duas secretárias, que já nos conhecia, mas não foi possível estender a cortesia a todos, uma vez que a sala de espera estava tomada de outros pacientes e respectivos acompanhantes.
Uma dessas atendentes pediu que aguardássemos um pouco, pois aquele era um dos últimos dias do ano de atendimento médico e, além das rotineiras consultas, muitos dos pacientes que lá estavam iriam passar por tratamento quimioterápico.
Ao lançar um olhar pela ambiente, era possível ver mulheres de várias idades, muitas com penteados pouco convencionais. Algumas com cabelos bem curtos, outras com a cabeça raspada e outras, ainda, usando algum tipo de aplique, fato esse que só tomamos conhecimento depois que algumas delas se manifestaram sobre isso.
Lembrei-me, então, de uma frase que li, não me recordo onde; ‘a vaidade de uma mulher brota da raiz de seus cabelos’. Levando-se em conta essa máxima, podia-se notar que todas elas (todas mesmo!) haviam abdicado de sua vaidade e fizeram vir à tona uma força visivelmente maior do que os problemas que enfrentam.
Porém, o que mais me chamou a atenção foi um outro detalhe muito importante. No final de cada atendimento, ou saindo do consultório de algum médico, ou deixando a sala de quimioterapia, elas passavam pelas secretárias e as cumprimentavam com um forte abraço.
Antes de ir embora, porém, todas elas, sem exceção, olhavam para as pessoas que estavam na sala de espera (lotada, repito) e, em razão da época do ano, acenavam para os presentes, desejando-lhes um ‘Feliz Natal’ e um ‘Feliz Ano Novo’, com um brilho especial nos olhos e uma sinceridade muito diferente do nosso ‘bom dia’ convencional. Aquilo foi uma experiência por demais emocionante!
Diante de tudo isso, podemos constatar que aquele pequeno grupo representa uma singela amostra do comportamento humano. Somente quando está diante de situações extremas é que se lembra de que é um ser social, envolto numa atmosfera que deveria ser de solidariedade.
Quando se veem às voltas com algo que faz referência à sua finitude, as pessoas são capazes de olhar para seus semelhantes com a humanidade que era para existir no convívio diário. Chega a ser curioso notar que são muito mais os aspectos voltados à morte que nos faz refletir sobre a vida. Entretanto, quando devidamente saudáveis, muitas das atitudes passam a ser de certo incômodo pela existência ‘do outro’.
Na rotina atual, fomos de certa forma adestrados que ‘viver é competir’, ser melhor em algum aspecto e ser mais bem sucedido que ‘o outro’, considerado um adversário (ou, em alguns casos, um inimigo) a ser batido. De acordo com o ponto de vista dos segmentos estritamente comerciais, viver nos dias de hoje é estimular a prevalência sobre o outro, tido por muitos mentores do moderno mundo competitivo como um concorrente, ou um ‘grande obstáculo’ a ser superado.
Minha particular lição de final/começo de ano é que tenhamos, acima de tudo, um olhar capaz de espargir energia saudável, quando lançado na direção do nosso próximo, e que eventuais diferenças sejam vistas apenas como normais características divergentes de ‘um outro eu’.
Que os cumprimentos de ‘Feliz Ano Novo’ se tornem diferentes dos já desgastados ‘bom dia’. Que eles sejam um desejo intenso e sincero, não um balbuciar automático de palavras vazias, conforme fomos devidamente condicionados ao longo de nossa vida. Sendo assim…
… Bom dia, Ano Novo!… Que seja repleto de dias bons!!!
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(OBS.: Texto também publicado na Revista Vicejar em 01.01.2020)