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Em mais de 20 anos como parlamentar aprendi que ao apresentar suas propostas legislativas as ações dos governos contra o povo encontram-se já nas “exposições de motivos” que as acompanham, antes mesmo de seus artigos, manipulando-se os números dos balanços orçamentários oficiais e atropelando-se criminosamente as quatro operações matemáticas. Por isso, ao me referir à exposição de motivos da Proposta de Emenda Constitucional 06, de 2019, para a reforma da previdência social no país, já aprovada em primeiro turno na Câmara Federal dias atrás, tomo emprestada de André Lara Resende, autor de “Juros, Moeda e Ortodoxia” (Companhia das Letras, 2017), a expressão referente à segunda parte do título de seu artigo publicado em 13 de janeiro de 2017 no jornal VALOR ECONOMICO, (“Juros e conservadorismo intelectual”). Resende, economista que presidiu o BNDES no governo de Fernando Henrique Cardoso, questionou na ocasião as bases intelectuais em que se formava a taxa básica de juros no país, a conhecida SELIC: “(…) a taxa básica de juros no Brasil causa perplexidade entre os analistas. Por que tão alta?”. Para o autor “as altíssimas taxas brasileiras ficaram ainda mais difíceis de serem explicadas diante da profunda recessão (…) de aumento do desemprego, que já passa de 12% da força de trabalho (…), enquanto no mundo desenvolvido os juros estão excepcionalmente baixos”, concluindo que” o custo do conservadorismo intelectual nas questões monetárias (…) já foi alto demais”. Agora, observando a exposição de motivos que acompanhou a PEC 06/2019, Denise Gentil, Doutora em Economia e Professora Titular da UFRJ, vê como seu carro chefe a ideia de que para o governo “nosso nó fiscal é a razão primeira para a limitação do nosso crescimento econômico sustentável. Esse nó fiscal tem uma raiz: a despesa previdenciária”. Em artigo disponível no portal Plataforma Política Social (“A assimetria do ajuste fiscal:Seria o déficit da previdência a causa do crescimento da dívida?”), Denise afirma que “a reforma da previdência do governo Bolsonaro vem sendo justificada por argumentos econômicos (…), ideias manipuladoras, reforçadas por representantes do mercado financeiro e propagadas ampla e tediosamente pela mídia para fidelizar seguidores e aterrorizar a população com verdades absolutas e inquestionáveis”, alertando que “uma investigação atenta e honesta sobre as contas públicas faz saltar aos olhos que o nó fiscal são os juros.” Enquanto o aludido déficit da previdência pesou entre 1,3% e 2,9% do PIB de 2009 a 2018, o déficit com os juros oscilou entre 5,1% (2009) e 8,4% (2015) do PIB, chegando a 5,5% do PIB em 2018, mas para o governo, porém, é preciso enfrentar o déficit da previdência para impedirmos o crescimento da dívida pública. Mais do que conservadorismo, essa tese expressa autêntica desonestidade intelectual já que mesmo com juros mais baixos até agora, a dívida só cresce, puxada pelas operações do tesouro nacional ante o déficit primário e as ações do Banco Central para o controle da oferta de moeda, como as operações compromissadas com os bancos, que saltaram de 0,5% do PIB em 2000 para 16,4% do PIB em 2018. Está nessas duas áreas, portanto, a causa da explosão da dívida pública, e não na previdência social. Por isso, aceitar os argumentos da PEC 06/2019 e votar SIM a essa reforma é, ao mesmo tempo, conservadorismo como escolha e desonestidade intelectual ante os números oficiais do tesouro nacional e do Banco Central. Por fim, como conclui Denise Gentil, “faz-se urgente colocar a nu o velho discurso acusatório do gasto previdenciário e mostrar que a verdadeira reforma que precisa ser feita é a reforma da política monetária.”
Obs: O autor é professor e Mestre em Educação pela UFPE
Foi Deputado Federal 2003-2014.
Criador e 1º. Coordenador da Frente Parlamentar de Combate à Corrupção (2004)
Na Câmara Federal foi autor da PEC 162, propondo o Plano Nacional de Desenvolvimento Urbano.