4 de outubro de 2011
Em regiões tropicais, não se percebe muito a entrada da primavera que chegou ao hemisfério sul na quinta-feira, 21 de setembro. No entanto, no Centro-oeste, mesmo se as chuvas atrasaram e as queimadas ainda continuaram a ferir o coração da nossa terra, a paisagem começa a mudar. Aqui e ali, as árvores florescem, os cajus começam a dar fruto e o campo verdejante celebram a renovação da vida. Grupos indígenas sobem montanhas para celebrar ritos de cura da terra.
A primavera é o sorriso da natureza que dança a vitória da vida. Por isso, as religiões antigas expressam sua adoração ao Espírito, não apenas com palavras, mas com dança. Para as tradições hindus, a dança é caminho para a sadhana, integração do ser humano no cosmos. Dançar é expressar o mistério divino, presente em nós, através da libertação do corpo e do espírito. Nas tradições afrodescendentes e indígenas, a dança é elemento de união com Deus. Na Bíblia, a Páscoa significa passos e começou como dança de primavera. Essa festa da natureza é sinal da ressurreição de Jesus, de todos nós e do universo. Vários salmos bíblicos foram compostos para ser dançados. Profetizas como Miriam, irmã de Moisés e Débora, juíza de Israel, expressaram a luta de libertação do povo através de cânticos e danças.
Mesmo se não sabe, toda pessoa carrega no mais íntimo de si uma dança que é só sua. Já nascemos com essa dança no coração, mesmo se, muitas vezes, a sociedade dominante e algumas tradições religiosas a reprimem. Por isso, muita gente não associa dança com espiritualidade. Entretanto, quando vencemos os preconceitos e permitimos que a energia da dança que está em nosso ser mais íntimo se expresse, estamos trabalhando para nos unificar interiormente. Ao mesmo tempo, como nas tradições mais antigas, ninguém dança sozinho, através da dança comum, colaboramos para que as relações humanas sejam mais afetuosas e o mundo se torne mais lúdico e feliz.
Atualmente algumas comunidades cristãs e de outras tradições espirituais redescobrem a dança como expressão de espiritualidade. Entretanto, é preciso que essa dança não seja apenas rito externo. Deve despertar em nós uma renovação do nosso ser e possibilitar que nossas comunidades eclesiais vivam, como desejou em seu tempo o papa João XXIII, uma primavera nova de diálogo e abertura a toda humanidade. Essa nova primavera da Igreja e do mundo pode contribuir para que a sociedade atual reencontre caminhos de esperança para a crise civilizacional em que se debate. O próprio diálogo aberto e sincero será como a expressão de uma dança interior e libertadora. Que essa dança de uma vida nova se espalhe pelo mundo, ajude as pessoas a construir uma profunda renovação ética da sociedade e seja sinal e instrumento de união com todo o universo.
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.
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