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A imprensa noticia que foi aberto, no Vaticano, o processo para a beatificação de Dom Hélder Câmara. A beatificação é o primeiro passo, antes da canonização. Realizada a beatificação, os fiéis, nas missas e nos atos religiosos, dirigirão suas preces ao beatificado invocando-o assim: Beato Hélder Câmara. Depois, com a canonização, o tratamento reverencial devido será: Santo Hélder Câmara.

Fico boquiaberto ao lembrar que apertei a mão de um beato, quando ele ainda vivia neste mundo. E mais que isto: falei com o beato.

Quanto estou às vésperas de marcar, no calendário, a oitava década de vida neste mundo, essas lembranças trazem-me conforto espiritual.

Meu último encontro com Hélder Câmara aconteceu no Recife, em 1997, dois anos antes da partida do beato em direção à morada definitiva, certamente mais confortável que a modesta morada que ele habitava, na periferia da capital de Pernambuco, onde era vizinho dos pobres e abandonados.

Quando tomou posse como Arcebispo da Arquidiocese de Olinda e Recife, Dom Hélder habitou o imponente Palácio Episcopal. Mas não se sentiu bem nesse nobre endereço. Vendeu o imóvel e aplicou o dinheiro na construção de casas para os pobres. Decidiu morar na periferia que, ali sim, estaria junto daqueles que mais ele amava.

A primeira coisa que observei, ao chegar (os juízes aprendem a observar detalhes), foi a total falta de proteção na casa. Embora isto não fosse da minha conta, supus que era do meu dever admoestá-lo: Dom Hélder, o senhor anda falando coisas que não são do agrado dos poderosos. Será fácil praticar aqui um assassinato, sem deixar pistas. Ele respondeu com um gesto e uma frase. Curvou a cabeça e disse: Está vendo estes fios de cabelo que ainda restam? Não cai um único fio sem que Deus permita.

Eu respondi: o senhor é um homem de Fé, Dom Hélder. Minha Fé tem o tamanho de um grão de mostarda. Peço a Deus que este encontro com sua pessoa, que esta vinda a sua casa, aumente minha Fé. Fui atendido. Depois deste dia acreditei com muita mais força e vigor no Cristo de Dom Hélder Câmara.

Por que usei a expressão Cristo de Dom Hélder Câmara? Que Cristo é esse?

É o Cristo na visão do profeta Hélder. Não é o Cristo que fica dentro das igrejas. Não é apenas o Deus que se fez homem. É o Cristo que está nas periferias, nas prisões, nas filas quilométricas dos hospitais, nas filas do Bolsa Família, nos corredores dos fóruns pedindo Justiça. Foi a este Cristo Vivo, não ao Cristo histórico, foi a esse Cristo que Hélder Câmara dedicou sua vida.

Obs: O autor é magistrado aposentado (ES), escritor, professor, palestrante. 
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