A noticia chega carregada do sal da fatalidade: Antonio Carlos Viana morreu. Então, fui catar nas minhas estantes os seus livros. Descubro os únicos que tenho, bem juntos. O primeiro, O meio do mundo e outros contos, edição de 1999, com atenciosa dedicatória: Ao Vladimir Carvalho, este reencontro através de meus contos. Abraços, Antonio Carlos Viana. O outro, estampando ainda o valor do livro, R$ 32,00, Aberto está o inferno, edição de 2004. Folheio um e o outro, vendo palavras e frases que me chamaram a atenção grifadas com tinta amarela. Depois, observo o que anotei no primeiro: relido, no carnaval, dias 21 e 22 (fev.2004). Alguns admiráveis, como…. e aí listo quase todos. No segundo, não fiz nenhuma anotação. Depois, aproveito o almoço na rua para adquirir o último livro lançado – Jeito de matar lagartas, edição de 2015, cujos primeiros contos devoro imediatamente, o final do último, que dá título ao livro, me fazendo rir. Os demais, guardo para ler na viagem para Recife, na segunda-feira. Depois, me recordo de ter lido um conto seu incluído em livro contendo os cem melhores contos brasileiros do século XX. Sempre achei que Antonio Carlos Viana escreveu melhores que o escolhido. 14
Junto os três livros, com o projeto firme de continuar a leitura do último e, em seguida, reler os dois primeiros, pausadamente, por sorver cada lance de todos os contos. Enfim, chego a conclusão de ser mentira a notícia. Antonio Carlos Viana não estava morto. Não podia morrer. Não morrerá nunca. Os seus contos – de tantos livros lançados, muitos dos quais, vou ver se consigo adquiri-los, – se constituem na grande e forte prova de que o autor está vivo, espalhando nas páginas de suas publicações todo o talento que trouxe no sangue para o conto, dentro do seu estilo de só escrever essencialmente o necessário, numa economia tão danada que parece o vendedor de feira, que, no momento do troco, lentamente, pega o maço de cédulas no bolso da calça, passando a procurar uma e outra, a exatidão do quantum deveria repassar. Nem mais, nem menos.
É esta a impressão que, da leitura dos três primeiros contos de Jeito de matar lagartas, me sobe à cabeça, como uma característica mais que fundamental na feitura dos contos, como marca de Antonio Carlos Viana como fabricante de contos, artesão da palavra medida, da frase curta, do termo devido, da história rápida e singela, onde meia dúzia de palavras acende o sol para clarear o fato narrado em toda a sua inteireza, de início até o final. O leitor, então, vislumbra toda a narrativa, até do desnecessário que não foi colocado no texto.
Antonio Carlos Viana não está morto. Nem morrerá. Os livros hão de tomar seu lugar, e, ele, agora, transformado em histórias, mais de cem, acredito, será, doravante, o que cada conto revela e transmite, na saudade que atiça a vontade de chorar, na admiração que sempre haverá de suscitar em todos que tiverem o prazer de debulhar seus livros, hoje, e o farão amanhã e sempre. Afinal, no momento em que se encanta, em seu lugar ficam os livros produzidos. Antonio Carlos Viana se multiplicou em vários livros, partindo, depois, para plagas desconhecidas, numa viagem sem retorno. Os livros ficam, nos contos confeccionados, como prova maior de que, retirado do palco da vida, o seu vazio é, de logo, preenchido. Viverá, assim, e, para sempre, nas mãos dos que vão continuar lhe lendo, como viverá nas estantes das bibliotecas, e, igualmente, na história da literatura sergipana, como um dos poucos a ser divulgado e lido nos grandes centros.
Que morto que nada! Ora, o homem está vivo, bem vivo, vivíssimo! 22 de outubro de 2016
Obs: Publicado no Correio de Sergipe
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras