NA OBRA ESCULTÓRICA DO MESTRE DIDI
Recebo do eminente professor e amigo, Jaime Sodré, um livro que acaba de publicar sob o título em epígrafe e que é uma verdadeira antologia sobre o tema.Lá Deoscoredes Maximiliano dos Santos, Mestre Didi, é sublinhado como artista máximo dos valores estéticos da expressão dos cultos afros mas como eterno lutador da afirmação dos valores afros, não só do ponto de vista religioso, mas da preservação da língua sacra, das lendas, do pensamento, enfim, da mítica “ como artífice dos símbolos sagrados, do rico repertório iconográfico dos Orixás”. O professor Sodré é de Salvador, é meu colega na Uneb, professor do Centro Federal de Educação Tecnológica, com especialização em Conteúdos e Métodos e Ensino e Mestre em Teoria da Arte da Ufba, Conselheiro do Grupo Cultural Olodum e do Projeto Pedagógico do Ilê Aiyê. Recentemente foi agraciado pela UNICEF pelo seu trabalho em favor da crianças carentes de Salvador.
Dentre os muitos postos que Mestre Didi ocupa no Terreiro de Mãe Stela, é ela quem lhe chama de “filho único de Mãe Senhora”. E o prof. Sodré, com uma acuidade que lhe é própria, mostra na sua obra que como resultado do tráfico de escravos para as múltiplas atividades, há uma vasta e importante contribuição literária. E na sua apreciação, ele faz uma cronologia dos estudiosos que enfatizaram o tema. Desde Nina Rodrigues que, “apesar das críticas contemporâneas”, recolheu um importante material que serve de uso para os pesquisadores atuais. Manoel Querino, que se opunha a Nina, e que se interessou pela contribuição africana. O elenco gravita em torno de Edison Carneiro, do pernambucano Gonçalves Fernandes, passa pela contribuição estrangeira de Herskovits, que estudou os “Antigos Reinos da África Ocidental”. Bastide e Vrger completam o cenário. Luiz Viana Filho, Vivaldo da Costa Lima, Juana Elbein,Valdeloir Castro, Yeda Castro, Júlio Braga, Marco Aurélio Luz, todos com sua contribuição específica, apesar de “ não caber aqui uma listagem exaustiva, no momento”.
Deixemos que o próprio Mestre Didi se apresente:” Os orixás do panteão da Terra são os que alimentam e nos ajudam a manter a vida.Os meus trabalhos estão inspirados na natureza, na Mãe-Terra Lama, representada pela Orixá Nanã, patrona da agricultura”.
Foi esse insigt que Sodré intuiu no famoso Mestre : quis relacionar a produção estética africana na categoria “arte”, em igualdade à manifestação, da mesma espécie, de outros povos, que tem provocado um esforço para vencer as barreiras do preconceito, do etnocentrismo.
Na impossibilidade de uma expressão bibliográfica em relação à tríade “religião, arte-sacra,arte plástica afro-brasileira, unificada e relevante, ele quis percorrer outros caminhos que não os da historiografia artística, de forma exclusiva. Hoje há uma tendência a se recorrer a outros campos do conhecimento como base para a compreensão do fato histórico- artístico.
O Sumáro de sua obra mostra o itinerário que quis percorrer. Começa sob o título impactante de Àfrica, “IBI SUNT LEONES”. Resgata, assim, aquela visão de tempos remotos, fruto de uma associação fantasiosa, proveniente das crônicas dos viajantes missionários, exploradores e até mesmo dos cientistas, que , mesmo com boa vontade, deram, desse continente, uma visão unitária, homogeneizante, esquecendo-se de sua complexidade e pluralidade étnico-cultural.E continua : Civilizações e estética africana, O negro no Brasil, escravidão e religiosidade, Religião afro-brasileira ( com uma grande ênfase para o espaço temático do Mestre), Mestre Didi, o artista do sagrado ou o sacerdote-artista, As esculturas do Mestre Didi, o arco-iris do olhar, Contribuição artística e histórica da obra do Mestre Didi.
O prof. Sodré, para enriquecer ainda mais a sua “obra sacra”, acrescentou no final do livro, o questionário, na íntegra, com as respostas do Mestre Didi.
Destaco, concluindo, duas pergunta-respostas:
– Mestre Didi, quem ensinou essa arte ao senhor? – Foi Mãe Aninha, depois que me confirmou como Asògbá, Sumo Sacerdote do Culto a Obaluaiyé, no Terreiro do Afonjá.
-A sua arte pode ser chamada de “Arte Sacra Brasileira”? –Sim, por que não? Sou descendente direto de uma família muito importante do reinado de Ketú, em 5ª geração. A família Asipá uma das sete famílias que saíram da Nigéria para fundar o reinado de Ketú em Daomé, atual República do Benin na África Ocidental.
Sebastião Heber Vieira Costa. Prof.Adjunto de Antropologia da Uneb, da Faculdade 2 de Julho, da Cairu. Membro da Academia Mater Salvatoris , do IGHB, do Instituto Genealógico da BA.