Nestes dias transcorreu o aniversário da morte do Papa João XXIII. Veio a falecer no intervalo entre a primeira e a segunda sessão anual do Concílio Vaticano II, no dia 3 de junho de 1963.
Como Moisés, que chegou às portas, mas não conseguiu entrar na terra prometida, assim o Papa João não pôde ver concluído seu acalentado sonho de um Concílio para a renovação da Igreja.
Mas, ao falecer, o processo conciliar tinha envolvido de tal modo a Igreja que ninguém duvidava de sua continuidade. Tanto que o seu sucessor, o Papa Paulo VI, fez da garantia de levar em frente o Concílio o seu primeiro compromisso.
Pois bem, neste ano não é só o calendário que nos traz à memória o Papa João XXIII. São tantas as semelhanças que somos levados espontaneamente a comparar o Papa João com o Papa Francisco.
Ambos se constituíram em inesperada surpresa, já pela sua eleição.
Em 1958 ninguém apostava no desconhecido Cardeal Ângelo Roncalli. Em 2013 houve todo tipo de especulação sobre os nomes mais prováveis, mas ninguém se deu conta de pensar no discreto Cardeal Jorge Mario Bergoglio.
Mas a surpresa da eleição, em ambos os casos, serviu para ressaltar ainda mais o acerto do conclave. Parecia que tinham tirado um tesouro escondido a sete chaves, presenteando a Igreja com um Papa que vinha sob encomenda, ao encontro de suas melhores expectativas.
Ambos foram rapidamente conquistando simpatia, que vai se acumulando como reserva preciosa de apoio para suas iniciativas pastorais.
Quando faltavam poucos dias para completar três meses de seu ministério, o Papa João XXIII, a 25 de janeiro de 1959, surpreendeu o mundo com o anúncio do Concílio Ecumênico.
Agora, por estes dias, também o Papa Francisco vai completar três meses do seu ministério. Ele já conquistou o mesmo grau de simpatia de João XXIII. Ele poderia contar, certamente, com o mesmo apoio dado a João XXIII para levar em frente o Concílio.
Mas aí mora a grande diferença de contexto eclesial. João XXIII veio antes de um Concílio. O Papa Francisco chega depois de um Concílio.
João XXII pôde desencadear um grande mutirão eclesial, onde todos se sentiam animados a participar. Não havia ainda resistências articuladas. Todos podiam partilhar os mesmos generosos sonhos de renovação da Igreja, pelo caminho amplo e seguro de um Concílio Ecumênico.
Agora, o Papa Francisco não dispõe de um símbolo tão eficaz e abrangente, como era o Concílio. Ele precisará fazer opções pontuais e concretas, que poderão ter, sem dúvida, o grande aval emprestado pelas propostas do Concílio Vaticano II, ainda não implementadas.
No tempo do Papa João, a adesão era global e genérica. Agora, o Papa Francisco precisará optar por questões pontuais, que tenham a possibilidade de retomar a amplitude do Vaticano II.
A primeira providência para desencadear o processo do Vaticano II foi a nomeação da “Comissão antepreparatória”, instalada no Pentecostes de 1959. Ela tinha a incumbência de identificar os temas a serem abordados pelo Concílio. Ela teve a boa ideia de ampliar a consulta às bases da Igreja, que responderam de maneira pronta e generosa.
Agora, o Papa Francisco também instituiu uma “comissão” de consultores para ajudá-lo a tomar as iniciativas mais apropriadas. O melhor que podemos desejar a esta Comissão é que ela se faça portadora dos anseios profundos de renovação eclesial, que o processo conciliar ainda não conseguiu efetivar.
De qualquer forma, o Papa Francisco pode contar com o mesmo apoio dado ao Papa João. Ele pode convocar. A Igreja estará pronta para acatar suas iniciativas. (09 de junho de 2013)
Obs: O autor é Bispo Emérito de Jales.