Na América Latina, surge um processo social e político novo. Em vários países, como Venezuela, Equador e Bolívia, o povo vota em novas constituições mais cidadãs e democráticas, ao mesmo tempo pela primeira vez, no continente inteiro, povos indígenas se reorganizam e se unem em torno de suas necessidades básicas e do fortalecimento de suas línguas e culturas. Este processo ocorre em meio a muitas contradições e dificuldades. Não poderia ser de outro modo, já que estas mudanças sociais e políticas têm ocorrido não por meios violentos de conquista do poder político, mas por eleições democráticas, ocorridas de acordo com costumes e condicionamentos que vêm de séculos. Obstáculos como o do recente golpe de Estado contra o presidente e o povo de Honduras têm sido como um alerta para muitos outros países. Embora pareça superada a época em que golpes militares eram modas no continente, há militares que querem deixar claro que esta hipótese não pode ser totalmente descartada.
Em meio a toda esta fragilidade, um ponto em comum é que nenhum país conseguirá avançar em justiça e igualdade social sem dar uma prioridade à educação. Não é por acaso que a Venezuela, que, há poucos anos, era campeã de analfabetismo, recebeu da UNESCO e da ONU o reconhecimento de que alcançou a taxa de analfabetismo zero, nos habitantes jovens e adultos. Também o governo de Evo Morales, na Bolívia, consagrou o ano de 2008 a 2009 como o tempo da cruzada da alfabetização em massa. No interior de Valle Grande, há 41 anos, o comandante revolucionário Che Guevara conduzia um grupo de combatentes internacionais para dar a sua vida para transformar as condições sociais e políticas na Bolívia. Ele começou o seu trabalho procurando educar os filhos dos lavradores, atendendo os muitos casos de doença como médico e garantindo aos nativos uma noção básica de higiene. Mas, apesar de ter se dedicado a este trabalho em prol dos pequenos, não foi compreendido pelos lavradores apavorados pelo terror do comunismo e ameaçados pelo exército boliviano, então, fortemente repressor. O comandante e seu pequeno contingente de militantes foram traídos por camponeses assustados. Hoje, quem viaja por aquelas paragens, encontra os mesmos lavradores organizados em grupos de base e lendo suas vidas com mais autonomia e compreensão do mundo. No Equador, embora o governo compreenda que somente a educação não provocará nenhum milagre de transformação da realidade, se não se faz justiça social, sabe também que nenhuma mudança profunda será possível sem passar pela educação de base, alfabetização de adultos e democratização do ensino e da universidade.
No Brasil, é preciso termos consciência de que estamos atrasados. As elites brasileiras nunca se incomodaram em democratizar a educação. Ainda gememos sob a taxa de 15 a 16% de analfabetos adultos ou pessoas que começaram a ser alfabetizadas e deixaram o curso sem conseguir ainda ler as suas vidas e dizer sua realidade. Além disso, os índices de jovens que abandonam a escola no ensino fundamental e no nível médio ainda é muito alto. E as universidades continuam a ser ilhas sem pontes nem barcos que as liguem às ruas do país real e à vida do povo ao qual deveriam servir.
Enquanto a Colômbia, o Peru, a Bolívia e o Paraguai têm boas universidades desde o século XVI, o Brasil começou o curso universitário em Olinda somente no século XIX. Mas, como disse o filósofo Mário Sérgio Cortella, “a primeira universidade de fato é a de São Paulo, que foi fundada em 1934. O próprio Ministério da Educação só existe a partir de 1930” (revista Fórum, junho 2009, p. 8).
No momento atual, o governo brasileiro está fazendo um bom trabalho no que diz respeito à Educação e, apesar das contradições e obstáculos que ainda se põem entre teoria e prática, esperamos que a educação seja cada vez mais democratizada e acessível a todos. O Ministério da Educação tem feito um trabalho excelente e prepara a 1ª Conferência Nacional de Educação para 2010. Os eixos fundamentais do trabalho são garantir a democratização do ensino de qualidade, a competência na gestão das escolas e do ensino, assim como a inclusão social dos mais pobres em todos os níveis da escolaridade.
Este caminho novo e democrático da educação é uma opção pelas crianças que têm mais dificuldade e não por aquelas que já merecem notas melhores. Trata-se de estimular os professores a optarem pelos pequenos e fracos e não pelos estudantes mais capazes, assim como o Estado não deve bonificar ou pagar a mais professores que conseguem melhores notas para suas classes. Não se trata de um campeonato de excelências, nem de concurso de “meritocracia” e sim de educadores que se dedicam ao mais frágil da corrente e sabem que os problemas são mais complexos do que apenas um sistema de notas e conceitos.
Para quem tem fé e busca viver uma espiritualidade ecumênica, a educação é a tarefa que mais nos aproxima dos grandes líderes espirituais da humanidade. Todos foram educadores e, de certo modo, optaram pelos últimos. Jesus Cristo, por exemplo, disse sempre: “Não são os que têm saúde que precisam de médico e sim os doentes. Vão e aprendam o que significa a palavra de Deus: ´Eu quero a misericórdia e não o sacrifício´. Assim também, eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores” (Mt 9, 12- 13).