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Uma das coisas centrais na forma como Jesus lidou com os homens, enquanto esteve na terra, foi como ele considerou – todas as vezes – aqueles que diante dele sofriam da “presunção de saber”.
É por isso que diante de escribas e fariseus, autoridades religiosas de sua época, ele nunca perdeu tempo explicando coisa alguma, ou quando interrogado por eles respondia com sabedoria, eventualmente com outra pergunta, ou ainda virando contra eles próprios suas tentativas de colocá-lo em contradição.
Entretanto, não apenas a ouvidos religiosos Jesus cuidou de não se cansar em explicações. Diante de multidões, muitas vezes interessadas apenas naquilo que como benefício material poderiam conseguir, como o pão que ele eventualmente multiplicava, tratou de falar em parábolas, porque conhecendo a dureza de coração dos seus ouvintes, sabia que embora seus ouvidos e olhos estivessem atentos nada podiam ver e ouvir com seus sentidos entorpecidos.
É assim que “o vinho novo não é posto em odres velhos, nem um pedaço de roupa novo usado para remendar uma roupa velha” (Mt 9:16-17). Não à toa, João Batista preparando as pessoas para a chegada do Reino de Jesus, começa convidar as pessoas a se batizarem como símbolo de metanoia, isto é, mudança de mentalidade. Mais tarde, Jesus, quando inicia sua pregação na Galiléia, começará fazendo o mesmo, convidando os homens a mudarem de mentalidade, porque o Reino estava próximo.
Houve também, nos dias de Jesus, um jovem fariseu chamado Nicodemos que sinceramente acreditava que Jesus era “um mestre enviado por Deus”, porque as coisas que Jesus fazia, para ele, claramente eram da parte de Deus. Esse jovem vai até Jesus para reconhecê-lo como enviado divino, um dia de noite, talvez para não ser visto, e é para ele que Jesus vai dizer que “ninguém pode ver o Reino de Deus se não nascer de novo”. Ora, ainda cheio da presunção própria de um fariseu – possuidor da revelação histórica de Deus e defensor da Lei mosaica – nascer de novo era um absurdo impensável!
Jesus perguntou a Nicodemos como sendo ele professor do povo de Israel não podia compreender a simplicidade daquilo que ele dizia. Estava, na verdade, ali diante de Jesus um homem profundamente conhecedor da religião, sabedor de toda moda doutrinária de sua época, mas vazio de qualquer transcendência, incapaz de fazer qualquer reflexão de espiritualidade simples, proposta fora daqueles esquemas aprendidos. “Se vocês não creem quando falo das coisas da terra, como vão crer se falar das coisas do céu?” (Jo 3:12).
Nicodemos, assim como todos os religiosos dos dias de Jesus, até aceitavam a origem divina de seus milagres, mas não podiam compreender a essência de sua mensagem, dado que a presunção de já possuírem o conhecimento de Deus, da revelação herdada do pai Abraão, não permitia que o curso da mensagem de Deus tomasse aquele contorno que Jesus agora dava, posto que admitir isso seria para aqueles homens como negar a validade de tudo que até então consideravam como sagrado, além de lhes impor uma nova vida, completamente diferente do establishment que eles e seus antepassados construíram.
O ápice do fruto dessa presunção de saber é o que levará Jesus a dizer àqueles homens que toda blasfêmia seria perdoada, menos aquela praticada contra o Espírito Santo.
Mestres da Lei de Moisés, autoridades eclesiásticas, não podendo legitimar as obras de Jesus como verdadeira manifestação de Deus, a quem Jesus alegava ser Filho, o que significava dizer que ele era o próprio Messias, trataram de atribuir os feitos de Jesus a Belzebu (figura conhecida como chefe dos demônios à época). A presunção daqueles homens era tanta que, não podendo admitir e controlar a genuinidade daquilo que em Jesus estava manifesto, preferiram blasfemar contra o Espírito de Deus e dar o crédito ao próprio diabo que se prostrarem diante da verdade inegável diante de seus olhos.
Atualmente, a maioria dos religiosos cristãos não experimentam o bem do Evangelho. Ser cristão basicamente resume-se a uma profissão de fé pública, seguida de determinados sacramentos como bastimo, ceia etc., vinculado à frequência a determinado local geográfico (templo), além da exigência da adoção de determinada moral. Poucos efetivamente são capazes de, em algum momento, despertarem do embotamento dos sentidos trazidos pela religião, e fazerem uma viagem no Evangelho por si mesmos, como Jesus mesmo propôs à samaritana (Jo 4).
Infelizmente, a mensagem do Reino ficou condicionada à presunção de saber! Não apenas isso, pior: o próprio Reino tornou-se, presunçosamente, aquilo que os homens como exteriorioridade são capazes de fazer. Os odres nunca estiveram tão velhos. Assim, os cristãos de hoje tornaram-se como os escribas e mestres da lei dos dias de Jesus que dos seus corações tiram coisas novas e coisas velhas, terrível presunção!
No imaginário cristão contemporâneo refazer a viagem proposta pelo Evangelho de Jesus tornou-se algo menor. Todos sabem. E se não sabem dizem saber. Ou infelizmente estão guiados pelas doutrinas variadas por aí que gritam e arrogam para si a verdade da revelação – tal qual a presunção dos religiosos dos dias de Jesus.
Não há em nós mudança de mentalidade e, consequentemente conversão, isto é, mudança de curso na vida, enquanto não damos razão absoluta a Jesus – com todas as implicações de assim fazê-lo, compreendendo que tudo isso não se trata de uma imposição da verdade, como conteúdo que se possa aprender e explicar, mas de uma relação com a Verdade, personificada no próprio Jesus encarnado, expressa em tudo que ele mesmo disse e fez.
Terrível presunção. Terrível risco de que quase todos, não tendo experimentado o verdadeiro bem do Evangelho, não o bem miraculoso – fruto da misericórdia de Deus, nem o bem teórico afirmativo que se declarando faz cessar as inquietações da vida, fizeram apenas a viagem da presunção (religiosa) de saber, e nunca puderam conhecer de fato o significado do BEM DO EVANGELHO, e o privilégio de carregar o selo de ser chamado “cristão”, isto é, aquele que não apenas crê no Cristo, mas é capaz de o manifestar em si. Que Deus nos ajude e abra os nossos olhos.
“A simplicidade de um estilo.”(JLopes)