Deixou-me um sentimento de profunda tristeza a delação do ex-ministro Palocci. Em Ribeirão Preto, ele iniciou sua militância na pastoral juvenil da Igreja Católica. Depois, atuou no movimento trotskista e ingressou no PT, graças ao qual fez uma carreira política meteórica: vereador e duas vezes prefeito de Ribeirão Preto (SP), deputado estadual em São Paulo, ministro da Fazenda do governo Lula e chefe da Casa Civil do governo Dilma.
Formado em medicina, revelou-se exímio economista. Sua fala mansa e ponderada, a capacidade de encobrir emoções, apesar das raízes italianas, fizeram com que setores da esquerda e da direita o admirassem e o considerassem confiável.
Lula teria preferido Palocci como seu sucessor, não fossem as acusações feitas no episódio envolvendo um caseiro de Brasília, em 2008, do qual foi inocentado pelo STF no ano seguinte.
Palocci é a primeira voz do núcleo duro do Planalto na gestão Lula a torpedear o seu líder. Pressionado pela reclusão carcerária, recorreu à única saída legal para tentar sair da prisão: a delação premiada. Denunciou Lula como “capo” da “cosa nostra” entre o PT e a Odebrecht.
Terá ele dito a verdade? O ex-senador pelo PT Delcídio Amaral fez o mesmo e, hoje, a Justiça atesta que ele mentiu. As investigações haverão de mostrar se as acusações têm ou não fundamento.
Palocci deixou o PT em uma sinuca shakespeariana. Se o partido não se posicionar diante de tão graves ofensas a seu líder e fundador, reforçará a velha sentença de quem cala consente. Se o PT realmente está convicto de que tudo é mentira e Lula merece ser defendido, só lhe resta uma atitude: a expulsão sumária de Palocci.
Já passou o tempo de o PT fazer autocrítica. Quem não deve não teme. E ao fazê-la só dará munição à direita se, de fato, tiver culpa no cartório.
Obs: Frei Betto é escritor, autor de “Ofício de escrever” (Anfiteatro), entre outros livros.
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