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Muitos dos meus amigos ateus não concordam comigo quando eu digo que Deus é a fonte primeira da Verdade, que só nele há autossuficiência na expressão do que é verdadeiro. O motivo principal da discordância é que esses meus amigos ateus acham que a fonte primeira da verdade é a razão pura ou, mais especificamente, a lógica.

Eles restringem a razão à lógica porque esta é a única forma de expressão racional que poderia ser eventualmente considerada autossuficiente e, portanto, a fonte da verdade. Para eles, portanto, o fundamento da verdade do mundo emana da lógica, de forma que Deus seria, quando muito, uma hipótese desnecessária.

Para defender a posição deles, esses meus amigos, de forma inteligente, sempre deixam bem claro que qualquer argumento, a favor ou contra a ideia de que a lógica é o fundamento primeiro da verdade, tem inevitavelmente de ser construído segundo as leis da lógica. Eles querem dizer que qualquer expressão de nossa crença (mesmo a fé) precisa ser colocada em um sistema lógico.

Ora, eles me dizem: “Você pode até não concordar que toda a averiguação da verdade provém da lógica, mas mesmo para expor a sua discordância você tem de fazer isso logicamente”. É como se a lógica fosse mesmo inevitável sempre que falamos de verdade. Continuam: “Você não tem como fugir dela! Qualquer que seja o seu argumento, ele tem de ser racional, de de ser construído de acordo com as leis da lógica”.

Meus amigos ateus estão certos neste ponto: não há mesmo como fugirmos da lógica, da razão, caso queiramos que o nosso argumento seja coerente e válido. Mas, talvez o que eles não saibam, é que nós, cristãos, não queremos fugir da razão, da lógica, da validade ou da coerência do argumento. Aliás, a conclusão a que chegamos de que a lógica não pode ser o fundamento último da verdade é baseada em um argumento da própria lógica, argumento este que é comprovadamente válido e coerente.

Como assim? Quer dizer que pela própria lógica podemos saber que a razão não é o fundamento da verdade? Sim, exatamente isso que quero dizer. A própria lógica estabelece que dela não pode surgir toda a verdade, de maneira que o candidato mais viável, racionalmente falando, é mesmo Deus. Segundo veremos, de acordo com a própria razão, a lógica tem de ser descartada como hipótese para explicar a fonte da verdade.

Antes de continuar, devo deixar claro que a lógica é antes de tudo uma linguagem, que se preocupa com a validade e não com a veracidade do que expressa. Todos concordamos que precisamos da lógica para manter a coerência e a validade naquilo que queremos expressar. A questão delicada aqui é a seguinte: embora a lógica seja uma linguagem, ela não é capaz de ser autossuficiente, no sentido de ser capaz de averiguar a veracidade de todas as afirmações que faz com base em elementos do próprio sistema lógico. Não basta que algo seja válido e coerente para que possa ser considerado o fundamento primeiro da verdade.

Permita-me esclarecer o que é validade e coerência. Validade é quando um argumento se desenvolve em respeito às leis da razão, às leis da lógica; coerência, por sua vez, é quando as afirmações que existem em um sistema lógico não contradizem outras informações do mesmo sistema.

Validade e coerência não tem por si sós relações diretas com a verdade. Eles somente se relacionam com a verdade quando fazemos a seguinte pergunta: será que um sistema coerente e válido é capaz de aferir a veracidade de todas as proposições desse mesmo sistema? Para que nós pudéssemos considerar a lógica como fonte primeira da verdade, como autossuficiente, teríamos que responder positivamente a esta questão. Não é o que ocorre.

Muitos pensadores da lógica não entendiam dessa forma. Para que se tenha uma ideia, Frege, Russell, e mais alguns, pensavam que toda a matemática (que traz elementos verdadeiros ou falsos: “2 + 2 = 5” é falso, ao passo que “2 + 2 = 4” é verdadeiro) poderia ser provada logicamente e isso, conforme enfatizava Hilbert, sem precisar de nada fora dela. Se realmente este fosse o caso, poderíamos dizer que a lógica seria autossuficiente na análise da verdade e que, portanto, poderia ser considerada como uma fortíssima candidata para ser a fonte primeira da verdade.

Para que a lógica possa ser a fonte de toda a verdade, portanto, não basta que ela seja construída validamente e que não se contradiga, é preciso que algo mais ocorra. Conforme disse, é preciso que todas as afirmações que o sistema traga sejam provadas a partir do próprio sistema e não a partir de elementos fora dele. Ora, se para provar a verdade de algo eu tenho de recorrer ao que está fora daquilo, então aquilo não pode ser o fundamento de toda verdade, já que se fundamenta em outra coisa, certo?

Em outras palavras, para que a lógica possa ser considerada como a fonte de toda a verdade, ela deveria ser capaz de ser independente de tudo o mais quando se trata de provar a veracidade de suas proposições, de suas afirmações. Tanto eu quanto os meus amigos ateus sabemos que a lógica é a ferramenta mais poderosa do pensamento e da própria ciência. Não se trata disso. Conforme eu disse, trata-se do fato de que, para que ela possa ser considerada a base de toda a verdade que existe, ela não pode depender de nada de fora de si para provar as suas verdades. Se ela estiver fundamentada em outra coisa, ela não pode ser considerada o fundamento primeiro da verdade, essa outra coisa é que deve ser.

Mas como saber se a lógica se baseia ou não em outra coisa para provar a verdade de todas as suas afirmações? Como saber se o projeto de Frege, Russell, Hilbert deu certo? Bom, este foi um tema estudado por muitos matemáticos na história. Tudo ia muito bem para os que achavam que a lógica era sim o fundamento de toda a verdade, pois era o elemento independente e autossuficiente. Para quem vivia neste mundo da lógica, dizer que a fonte da verdade era Deus representava um verdadeiro disparate e era mesmo motivo de risos. A própria ciência mudaria a hostória.

Ocorre que em 1931, um matemático chamado Kurt Gödel publicou alguns teoremas que mudariam completamente o entendimento de que a lógica, a razão, poderiam ser o fundamento de toda verdade. Em linguagem bem simples, o que Gödel provou pela lógica foi que os sistemas lógicos não poderiam ser ao mesmo tempo consistentes, válidos e completos. A completude de um sistema representa, vamos dizer, a sua autossuficiência, ou seja, um sistema completo seria aquele em que a verdade de todas as afirmações dele poderiam ser provadas sem menção a nada fora do próprio sistema.

O que isso quer dizer? Quer dizer que Gödel provou que os sistemas lógicos poderiam não contradizer a eles mesmos, poderiam ser construídos validamente, mas algumas das verdades desses sistemas não poderiam ser provadas pelo próprio sistema. Era necessário que fossemos buscar um fundamento mais, permita-me o pleonasmo, fundamental. Um fundamento a partir do qual as verdades dos sistemas lógicos pudessem ser provadas.

Em outras palavras, o que Gödel demonstrou foi que a própria razão estabelece os seus limites, e prova-se a si mesma como coisa emanada e não como algo que é o fundamento de toda verdade. O que ele provou é que a razão não é autossuficiente, ela exige que exista algo maior, infinito e autossuficiente no qual todo a lógica, matemática e razão devam-se apoiar.

Os meus amigos ateus às vezes não se dão conta de que a crença em Deus é uma crença tão racional que a própria razão, mesmo quando mostra as suas limitações, aponta para ela. A própria razão prova-se a si própria como incompleta, sugerindo que ela emana de algo que não é ela mesma. Além disso, ela sugere que esse algo deve ser autossuficiente e, como tal, deve ser a fonte da qual toda a verdade emana.

Alguém poderia ainda questionar: mas o que dizer do sistema de fé? Se nem a razão é autossuficiente, a fé seria? Em outras palavras, alguém poderia ponderar que os teoremas de Gödel também provam que não há completude no sistema de crenças dos Cristãos, por exemplo. Ora, uma pessoa que alegasse isso estaria correta. A fé cristã se sustenta racionalmente (1 Pedro 3:15), mas o seu fundamento último de verdade é Cristo, que é Deus, e não a crença nEle. Tanto é assim que Cristo não diz que apenas tem a verdade, mas ele diz que é a própria Verdade (João 14:6). A fé cristã, assim como a ciência, não são autossuficientes. Somente Deus é autossuficiente.

Uma coisa que meus amigos ateus, caso queiram ser lógicos e racionais, têm de concordar é o seguinte: independente da crença que uma pessoa professe, se testarmos pela lógica as hipóteses de Deus e da razão como melhor candidata para ser o fundamento de toda verdade, só uma subsiste racionalmente. E esta, conforme vimos, é Deus.

Obs: Imagem enviada pelo autor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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