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“Tapas”, de José Corbacho e Juan Cruz, é um filme que aborda os relacionamentos humanos de modo sensível, traçando um paralelo entre as visões do amor nas diferentes fases da vida: do garoto que se apaixona pela quarentona solitária ao jovem casal oriental que vive o auge do amor; dos relacionamentos da meia-idade ao companheirismo e a cumplicidade da velhice. Figuras humanas simples e marcantes compõem a história, como a velhinha traficante, o abnegado cozinheiro chinês, o amargurado dono do bar. Cinco universos são vistos pelo cotidiano das ruas, do bar, das lojas e do mercado, que mostram as inquietações e esperanças de cada ser humano. Em cada uma dessas histórias há segredos e responsabilidades a assumir, mas diante de cada existência, as personagens são levadas a uma única e mesma decisão: fazer o que tem de ser feito.
Todas as religiões prometem a salvação. Porém, não somente em um sentido religioso, mas também filosófico, encontramos a salvação como objetivo do ser humano. Para os filósofos gregos, a palavra salvação (sotería), ou salvar-se (sózein), possuía significados bem concretos. Em primeiro lugar, sózein era o mesmo que “livrar-se de um perigo”. Aqui salvação possui a referência de algo negativo que pode vir a acontecer, salvar-se de algo que pode prejudicar. O verbo era empregado no sentido de manter em torno de algo uma proteção que lhe permitirá se conservar no estado em que está. Esta proteção não era somente no sentido material, mas também moral, espiritual, ou seja, salvar-se era empregado quando se queria conservar e proteger algum valor ético, como o pudor, a honra ou, eventualmente, a lembrança. Porém, para os gregos, salvação significava muito mais que simplesmente proteção. A palavra sotería era empregada não somente diante de uma ameaça, mas principalmente na perspectiva de algo positivo. Sózein significava para os filósofos gregos “fazer o bem”. A salvação era o movimento de criar e cultivar o bem-estar, desenvolver o bom estado de alguma coisa, alguém ou de uma coletividade. Plutarco, por exemplo, afirma que, quando sofremos um luto, não devemos nos entregar, nos fechar na solidão e no silêncio, negligenciar todas as nossas ocupações. É preciso, diz ele, continuar a assegurar a saúde e a salvação (sotería) daqueles que vivem conosco. Quem se salva é quem está em um estado de alerta, de resistência, de domínio e soberania sobre si, que lhe permite repelir todos os ataques e todos os assaltos. Mas quem se salva é principalmente quem vai à busca da felicidade, da tranquilidade, da serenidade, de melhor qualidade de vida. Portanto, o termo salvação se remete à própria vida. A salvação não faz imediatamente referência à morte ou imortalidade. Salvar-se é uma atitude que se desdobra ao longo de toda a vida e cujo único operador é o próprio sujeito. Se a salvação conduz a uma meta, esta não se encontra na pós-morte, mas no aqui e agora. “Considere-se responsável por um padrão superior ao que todos os outros esperam de você” (Henry Ward Beecher).
Neste sentido, para os gregos, a salvação sempre abrangia duas outras grandes expressões: a ataraxia e a autarcia. A ataraxia é a ausência de perturbação, domínio de si que faz com que nada nos perturbe. Salvação é, portanto, nos tornarmos inacessíveis aos infortúnios, às perturbações, a tudo o que pode ser induzido na alma pelos acidentes, pelos acontecimentos exteriores. “Não serve de nada atormentarmo-nos com uma coisa depois de a ter feito, a não ser para torná-la pior” (Bonaventure des Périers). A autarcia significava a auto-suficiência que faz com que nada mais se necessite senão a si mesmo. Em outras palavras, salvar-se era, acima de tudo, uma atividade permanente do sujeito sobre si mesmo. A salvação não é um fenômeno que “cai do céu”, mas uma atividade que deve ser desenvolvida pelo ser humano para uma verdadeira autonomia e tranquilidade diante de todos os fatos circunstanciais da vida, sejam eles alegres ou tristes. Por fim, a salvação do sujeito estava intimamente ligada à salvação da polis, ou seja, da coletividade. Para Platão, salvando os outros, simultaneamente, se salvava a si mesmo. A verdadeira salvação significa o desenvolvimento de um espaço de vida para todos os seres humanos. Neste movimento concreto de bem-estar de todos que vivenciamos verdadeiramente a salvação religiosa, ou seja, o encontro com Deus. “Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos anos e são muito bons, mas há os que lutam toda a vida e estes são imprescindíveis” (Bertold Brecht)