A reforma do ensino médio proposta pelo governo Temer-Mendonça, através de medida provisória, contém falhas gritantes. Sequer foi debatida com os educadores e o Congresso Nacional.
Uma das falhas é pretender que os alunos frequentem a escola em tempo integral. Dos 6,7 milhões de alunos do ensino médio, apenas pouco mais de 400 mil têm condições de cumprir esta exigência. Muitos são obrigados a dividir o tempo entre o trabalho e a sala de aula. E não basta adotar tempo integral se o conteúdo do ensino é precário e a pedagogia equivocada.
O que se pretende ao falar em educação escolar? Formar mão de obra qualificada para o mercado de trabalho? Conceder diplomas que enriqueçam currículos? Favorecer o acesso a melhores salários?
É isso que está na cabeça e na instrução de inúmeros estudantes submetidos ao paradigma pós-moderno da ditadura do mercado. A mais exponencial idolatria do século XXI é a fé no livre mercado como capaz de distribuir riquezas e sanar as desigualdades sociais. O que, aliás, jamais foi comprovado pelos fatos históricos.
Os últimos 200 anos de capitalismo demonstram que as desigualdades mundiais se acentuaram e, hoje, segundo a Oxfam, apenas 8 pessoas usufruem de uma fortuna equivalente à renda de 3,6 bilhões de seres humanos, a metade da humanidade.
A escolaridade deixa de cumprir o seu papel quando não forma consciência crítica e protagonismo social. A liberdade humana não pode ser confinada à mera escolha de diferentes produtos da prateleira do supermercado. Deve ter como fundamento, não a preferência do consumidor, e sim os direitos do cidadão e a ética em sua amplitude social.
Não se pode educar sem suscitar nos educandos o sentimento de indignação diante das injustiças, e a esperança de que o mundo em que vivemos pode e deve ser diferente e muito melhor.
A idolatria do mercado, denunciada pelo papa Francisco, quer nos convencer de que as receitas do FMI são preceitos sagrados, inquestionáveis. A oscilação da Bolsa de Valores gera inquietação, e a indiferença reina quando se depara com a notícia de que mil haitianos foram mortos pelo furacão Matthew, e 4 mil refugiados africanos engolidos, em 2016, pelas águas do Mediterrâneo.
Uma educação de textos sem contextos, de noções descoladas da realidade e ignorância quanto ao passado histórico é uma ferramenta de alienação da sociedade.
Essa educação temer(ária) só contribui para aprofundar a negação de todos os direitos sociais conquistados a partir da Constituição de 1988.
Felizmente, os próprios alunos estão assumindo seu protagonismo social e ocupando escolas para exigir melhorias do ensino. Eles sabem que governo é como feijão, só funciona na panela de pressão.
Obs: Frei Betto é escritor, autor de “O que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.
Copyright 2017 – FREI BETTO – Favor não divulgar este artigo sem autorização do autor. Se desejar divulgá-los ou publicá- los em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, entre em contato com – MHGPAL – Agência Literária ([email protected])