1.CELEBRANDO A SAUDADE E A ESPERANÇA: ADEUS!
O culto em memória dos “Defuntos” é tão antigo quanto a própria morte…
Nós cristãos e cristãs, porém, seguidores e3 seguidoras d’Aquele que morreu, mas ressuscitou, quando homenageamos as pessoas que terminaram suas vidas neste mundo (“finados”), não lembramos “mortos”… Não valeria a pena gastar tanta energia e emoção, se quem morreu “se acabou”…
Sobretudo, quando a lembrança que temos é de alguém que fez de sua vida uma expressão de amor, aí é que seria um absurdo imaginar essa pessoa como “morta”.
Afinal de contas, a fé na Ressurreição é a fé na vitória do Amor. O Amor para nós é sinônimo de “vida eterna”, porque o Amor é Deus, “pois Deus é amor”, assim se lê na 1ª Carta de João 4,8.
A tradição cristã, então, em vez de lembrar os que morreram com lamúrias e lamentações, faz memória dessas pessoas com cantos, hinos e salmos de esperança.
E por mais que soe triste a nossos ouvidos a palavra “Defunto”, essa é a palavra correta. “Defunta” é a pessoa que desempenhou seu papel completamente, cumpriu sua missão, como diz o Apóstolo Paulo, “combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé” (2ª Carta a Timóteo 4,7).
E a gente se despede destas pessoas ou faz memória delas, reverenciando-as e dizendo, esperançosamente “Adeus!”, isto é, professando nossa fé na certeza do reencontro, um dia, com elas, nada menos que “em Deus”, na “Casa do Pai-Mãe” de todos e todas nós, em Jesus Cristo que morreu e ressuscitou.
2. FESTA DE TODOS OS SANTOS E SANTAS, TESTEMUNHAS DO SENHOR
Mt 5,1-12
A palavra usada por Jesus, “Felizes!”, corresponde ao nosso “Parabéns!”.
Jesus felicita aquelas pessoas que fazem a diferença, do ponto de vista do Reino de Deus. E ser santo ou santa não é mais nem menos que isso:
– sentir-se e colocar-se, diante de Deus e dos seus semelhantes, como um “pobre”, isto é, sem outra pretensão que “fazer a vontade do Pai”, colocando-se a serviço dos irmãos e irmãs…
– tomar pra si a dor alheia, ser solidário no sofrimento,
– ser incapaz “de matar uma formiga”, de violentar quem quer que seja…
– ter fome e sede da Justiça do Reino, indignar-se perante toda injustiça…
– ser capaz de compreender e perdoar…
– ter um coração sincero, sem dolo, sem falsidade, sem hipocrisia…
– trabalhar pela paz…
– mesmo que para isso tenha ser mal visto, odiado e perseguido!
Antes de nós, as pessoas que hoje homenageamos como Santos e Santas já receberam os “parabéns” de JESUS!
Cabe a nós espelharmo-nos neles e nelas, e procurarmos fazer a diferença, como eles e elas fizeram, onde quer que a vida nos coloque!
Somente assim, nossa homenagem será sincera, e honesta, a nossa devoção aos santos e santas.
O mundo precisa de testemunhas do bem, mais do que de técnicos do progresso e de pregadores da religião. Como dizia Gandhi: “Seja você mesmo a mudança que deseja para o mundo!” E Agostinho Neto, o primeiro presidente socialista de Angola, completa: “Não basta que a nossa causa seja pura e justa. É preciso que a pureza e a justiça estejam dentro de nós!”.
Santos e Santas: mais que só “proteção”, sejam eles e elas, para nós, inspiração!
3. DA ADVERSIDADE E DA PERSEVERANÇA
Lc 21,5-19
Essas previsões proféticas de Jesus com relação ao futuro da instituição religiosa do seu povo… com relação às instituições políticas dos povos em conflito… com relação às adversidades todas por que passarão as gentes, inclusive por conta das epidemias e distúrbios da natureza… com relação aos “salvadores” de última hora… com relação às perseguições que sofrerão seus discípulos e discípulas… nos parecem estranhas, improváveis, sem muito a ver com nossa realidade, nesses últimos tempos ou em qualquer fase da história?…
Ou têm elas tudo a ver, em qualquer tempo, com a própria condição humana, e nos servem como premonição sobre o caráter relativo e provisório de toda construção humana, de todo sistema econômico, social, político, religioso e cultural?…
E eis que a proposta do Reino, esta sim, precisa ser sempre, de novo, anunciada, em qualquer lugar da nossa geografia, em qualquer época da nossa história. Ela é a referência que sempre permanece, a Boa Nova que nunca envelhece, mas que, também, sempre incomoda, inquieta e sofre contradição…
Seus portadores sempre encontrarão resistência. Suas testemunhas, sempre serão perseguidas… E quando tudo vai muito tranqüilo, é para desconfiar…
Importante será sempre manter viva a consciência de que somos, apenas, portadores e não donos ou, muito menos, negociantes da Mensagem do Reino…
A princípio, “portador não merece pancada”, mas já está previsto que as levaremos, assim como está prometido que “é pela vossa perseverança que conseguireis salvar vossa vida!”
Com nossas mentes esclarecidas e nossos corações confiantes, cantemos ao Senhor da Natureza e da História!
4. UM REI CRUCIFICADO
Lc 23,35-43
Trata-se do maior espetáculo da História. Tanto assim que “o povo permanecia lá, olhando”… Uma tragédia, sem dúvida, anunciada:
> alguém que gastou sua vida na prática da solidariedade com seu povo, ou melhor, com os excluídos do seu povo e de todos os povos, de todos os tempos e lugares, tal o alcance da sua mensagem e do seu testemunho..
> alguém que investiu todas as suas energias, toda a sua juventude, toda a sua breve existência a anunciar, com vigor e persistência, seu sonho maior, o Reino de Deus, que é o Reino da Felicidade dos pobres, dos que passam fome, dos que estão chorando, dos que são perseguidos por serem fiéis a Ele… e, por outro lado, a desgraça dos ricos, dos que estão fartos, dos que estão rindo, dos que são bajulados por todos…
> alguém que denunciou a hipocrisia das lideranças religiosas, incapazes de compadecer-se dos assaltados de todo tipo, que estão morrendo à margem das estradas do mundo…
> alguém que anunciou a Boa Nova aos empobrecidos, a liberdade aos oprimidos e um tempo novo de reconciliação e de paz… morre agora pregado numa cruz, entre dois marginais, ridicularizado e desafiado: “Salve-se a si mesmo!”…
Neste momento supremo, ele demonstra, de maneira cabal, aquela mesma fidelidade, que demonstrara, no início da sua missão, quando tentado no deserto, não vai na onda do demônio, da busca dos seus interesses e vantagens pessoais. Se é para salvar alguém, que seja o marginal que lhe sofre ao lado.
Este é o Rei que desautoriza e descarta qualquer tentativa de avalizar, em seu nome, a acumulação de riquezas, a concentração de poder, a ostentação de luxo e prestígio mundanos por parte de seus seguidores.
Com que atitudes existenciais, individuais e coletivas, nós o testemunharemos?… Com que rituais, com que cantos celebraremos a sua memória?…
Se a Igreja, especialmente aquelas pessoas que foram ordenadas para os ministérios de acompanhar, articular e coordenar a vida comunitária, em todos os níveis, escutassem o Papa Francisco, seguissem seu exemplo e se pusessem a espelhar-se diante deste Rei Crucificado, com certeza, encontrariam o modo melhor de dar testemunho dele, por uma vida de austeridade simplicidade, onde qualquer aparência de luxo e qualquer atitude de arrogância desapareceriam.
Obs: Reginaldo Veloso de Araújo é Presbítero das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs, no Morro da Conceição e Adjacências, Recife-PE.
Compositor litúrgico, com diversos CDs gravados pela COMEP/Paulinas e pela PAULUS