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Em todo o Brasil, junho é marcado pelas festas juninas. Quem acompanha os costumes das várias regiões do Brasil sabe que estes festejos estão ligados a danças tradicionais do meio rural, quando as pessoas viviam uma relação mais forte com a terra. As comidas típicas deste tempo são sinais disso. No Nordeste, o milho é elemento fundamental das festas de junho. No frio do sul, o pinhão cozido e a bebida do quentão fazem parte da alegria. Tanto as danças, como as comidas são símbolos dos antigos cultos à Mãe Terra.

Até o nome do mês de junho é uma homenagem a Juno, deusa-mãe dos antigos romanos, responsável pela fertilidade da terra e pela fecundidade feminina. Nos tempos posteriores, esses ritos da fertilidade assumiram vestes cristãs. O povo dedicou estas festas a Santo Antônio, São João Batista e São Pedro, cujas festas a Igreja celebra em junho. A estes santos o povo atribuiu poderes semelhantes às divindades antigas. Santo Antônio herdou o título de “santo casamenteiro”, São João Batista ficou ligado à fogueira, enquanto São Pedro vê sua festa tomada pelos festejos do boi-bumbá. De fato, na tradição cristã, Santo Antônio se mobilizou pela capacidade de comunicação. São João Batista é comparado no evangelho a um fogo que comunica a luz (Jesus). São Pedro é um exemplo de mártir, ou seja, de alguém que arrisca a vida pela fé. De alguma forma no conflito representado no bumba-meu-boi este elemento de quem dá a vida por amor é preponderante. Assim, na América do Sul, as fogueiras que se acendiam em homenagem ao sol que renasce no solstício do inverno se transformaram em homenagem a São João. As quadrilhas devolvem ao povo mais simples ritos e danças antigas das cortes européias. Até hoje, vemos pobres se chamando uns aos outros de cavalheiros e damas. Pessoas do campo se fantasiam de ricos e dirigem a quadrilha com expressões francesas, por eles reinventadas.

Estas manifestações populares são mais do que apenas uma expressão nostálgica do passado. Vão bem além do turismo comercial que leva multidões a Campina Grande na Paraíba e a Caruaru, em Pernambuco, eleitas como sedes das maiores festas juninas do país. Mesmo já despojados do seu caráter religioso primitivo, estes costumes remetem a ritos pré-cristãos que, hoje, são valorizados novamente não para nos levar a adoração a elementos naturais, mas para descobrirmos a presença divina na terra, na água, no fogo e no ar, assim como em todos os seres vivos. Além da urgência de novas medidas de proteção ao ambiente, a defesa da natureza precisa de uma nova relação de amor do ser humano com a natureza. Isso não surge de forma desligada da ecologia social, isto é, de um mais profundo cuidado com a justiça e as relações entre as pessoas. Mesmo se no plano social e econômico, continuamos a ser desiguais, temos de exercitar uma verdadeira igualdade como cidadãos(ãs). Neste sentido, a participação em ritos como as festas juninas é como ensaio de uma sociedade nova, mais justa e participativa.

Viver profundamente é sinônimo de arriscar novos rumos e abrir-se ao desconhecido. O ser humano é um peregrino da história e sua vida muda quando descobre que seu destino está ligado ao de todas as criaturas do universo. Theillard de Chardin, um dos cientistas pioneiros na arte de ligar fé e ciência, afirmava: “Duvido que haja, para o ser pensante, minuto mais decisivo do que aquele no qual, lhe cai a venda dos olhos e ele descobre que não é um elemento perdido nas solidões cósmicas. Ele vê que uma energia universal de amor à vida converge e se humaniza dentro de seu próprio ser. Cada pessoa não é um centro estático do mundo – como durante muito tempo se julgou – mas eixo e flecha da evolução. Isso é muito mais belo”.

(*) Monge beneditino, teólogo e escritor.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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