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“A Igreja cristã tem dois pulmões: o ocidental e o oriental. E precisa dos dois para respirar”. Essas palavras de João Paulo II tornam-se mais atuais nesses dias em que Francisco, o bispo de Roma e Bartolomeu, o patriarca de Constantinopla, juntos, foram à ilha de Lesbos, na Grécia para levar o apoio das duas Igrejas aos migrantes e refugiados, a maioria deles muçulmanos e de outras religiões, praticamente presos em uma espécie de campo de concentração, de onde não podem sair para entrar na Europa. O papa e o patriarca querem chamar a atenção do mundo para o drama humano desses milhares de homens e mulheres privados do direito humano de migrar, direito reconhecido pela ONU já em 1948.
Em fevereiro, o papa Francisco aceitou encontrar-se com Alexis II, patriarca de Moscou. Era a primeira vez em que se encontravam um papa de Roma e um patriarca da Igreja Russa. Como havia muitas dificuldades e obstáculos, a visita foi bem preparada. O patriarca impôs várias condições para o encontro se tornar possível. O papa Francisco deu uma lição de humildade e de profunda busca da unidade ao aceitar todas as condições para que o encontro ocorresse. Tudo para abraçar o patriarca e chamá-lo “irmão”. Em 1964, o papa Paulo VI e o patriarca Atenágoras cancelaram a excomunhão recíproca que seus ancestrais tinham publicado em 1054 e oraram juntos em Jerusalém. Em 2014, cinquenta anos depois, o papa Francisco e o patriarca Bartolomeu I refizeram o mesmo gesto de orar juntos em Jerusalém.
No plano teológico, a Igreja Católica que, por séculos, tinha concentrado sua teologia no pecado e em uma espiritualidade medieval muito fixada na paixão e na dor, aprendeu dos cristãos orientais uma espiritualidade mais baseada na bênção divina e na criação. Restaurou a centralidade da ressurreição de Jesus na vida dos crentes e passou a testemunhar uma fé mais centrada na unidade do mistério pascal. Depois que o papa Francisco publicou a encíclica Laudatum sii sobre o cuidado com a casa comum e a urgência de uma Ecologia integral (que integre o cuidado com o ambiente e a justiça social), todos nós nos damos conta de que também nesse caminho, precisamos de nossos irmãos das Igrejas do Oriente que, desde os séculos antigos, têm valorizado muito mais a dignidade da criação como sacramento divino (uma espécie de corpo de Deus presente no mundo). A teologia ortodoxa atual tem desenvolvido mais e de uma forma integrada à fé e à espiritualidade litúrgica cotidiana a responsabilidade das Iglesias frente à atual crise ecológica[1].
Nesses dias, o mundo recebe com sofrimento e se preocupa com as notícias de perseguição e martírio de cristãos orientais em países do Oriente Médio. Quem vive na América Latina sabe que, nesses últimos 50 anos, muitos cristãos, católicos e evangélicos, homens e mulheres sofreram perseguições e muitos deram a sua vida para testemunhar a justiça e a busca da paz. Eles quiseram viver sua fé na solidariedade a lavradores perseguidos, a povos indígenas ameaçados de extinção e a comunidades de periferia, marginalizadas por um sistema social e econômico que exclui os pobres. Essa experiência nos leva a apoiar nossos irmãos e irmãs do Oriente que sofrem perseguições, sejam cristãos, budistas, muçulmanos ou sem religião. Com eles, queremos testemunhar que o martírio não é somente uma forma de morrer, mas de viver. Isso significa viver em comunhão, solidariedade e na luta pacífica por um novo mundo possível.
[1] – Sobre eso, en septiembre de 2014, en el Monasterio de Bose, en el norte de Italia, ocurrió un Congreso Ecuménico Internacional de espiritualidad ortodoxa sobre “El hombre, guardia de la creación”. En ese congreso han participado representantes de casi todas las Iglesias ortodoxas.
Obs: O autor é monge beneditino e escritor.