Prólogo
Era manhã do dia 23 de julho do ano de 1996, aniversário da minha mãe, estava saindo da Vila de Fordlândia, Município de Aveiro, Estado do Pará, às margens do Rio Tapajós. Seu Raimundo, homem magro, rosto sofrido maltratado pelo sol, com cerca dos 40 anos, com um bigode preto barba rala e por fazer tinha ido me buscar, foi em um barco de madeira medindo cerca de 10 metros de comprimento com nome de “Corjesu”, tinha só uma meia cobertura de madeira e zinco, um tipo de batelão, movido por um motor central a diesel, que fazia um barulho ensurdecedor, assoalho de madeira com algumas tabuas tiradas com motosserra, não tinha banco, aos lados uma borda de pranchão onde segurando uma das vigas de sustentação da cobertura me sentei.
Eu de camiseta branca, bermuda jeans e sandálias de borracha nos pés para poder entrar e sair do barco. Em uma mochila o material litúrgico e um par de roupa para trocar.
O Rio Tapajós estava calmo, a luz do sol refletia nas águas plácidas esverdeadas enquanto lentamente íamos nos afastando do trapiche. O seu Raimundo que tinha ligado o motor com muito esforço na manivela, agora estava no leme e um garoto de aproximadamente uns dez anos de feições indígenas bombeava manualmente a água que se infiltrava embaixo do assoalho da embarcação. Eu tinha um compromisso às dez horas e já passavam das 06h. Chegaríamos a tempo pois a comunidade de Vista Alegre era bem próxima, bastava atravessar e seguir um pouco rio abaixo deixando para trás a comunidade de Ribeirinha.
Comecei a me preparar mentalmente, na oração da manhã já tinha lido o trecho do evangelho em que Jesus se revelava aos discípulos na montanha como o verdadeiro filho de Deus. Estava olhando para as límpidas águas e ao banzeiro provocado pela embarcação. Comecei a orar, implorando em minha oração sobre qual recado Deus queria colocar em minha boca para dizer àquele povo…
– Senhor, Deus pai de bondade, infinita é tua sabedoria, estou aqui para falar em teu nome e celebrar a tua memória presente na eucaristia junto a esta comunidade. Qual o recado de amor e ternura que devo transmitir? Como poderei saber que é a tua mensagem que está sendo transmitida e não a minha? Pois bem sei Senhor, das minhas fragilidades e fraquezas e que não sou merecedor de qualquer privilégio teu, mas confio simplesmente na tua bondade e misericórdia. Se me escolhestes para estar aqui, me ungindo como sacerdote, aceito esta missão e este desafio, por mais difícil que seja….
– Me responda senhor, fale comigo!… quero aprender de ti. Qual o segredo da vida eterna? Como fazer desta vida um caminho para a tua casa, onde dissestes que haviam muitas moradas?
-Pai, Pai…
O barco continuava a travessia do rio tapajós a singrar a água iluminada pelo sol, onde as gotas pareciam diamantes dourados a dançarem audaciosos em um show particular que faziam a mim que as admirava.
Na oração a conexão com a vida em sua plenitude.
Na vida em frenesi junto a mim, a expressão de Deus amando suas criaturas.
Uma atitude…
Sua mão me tocando, uma paz, uma sensação de preenchimento…
– Senhor, já posso te ouvir !!!!
– Senhor, estou te ouvindo!!!
Fiquei mudo, um silencio ensurdecedor tomou posse de mim, enquanto comecei a transpirar, tremer… Nunca tinha me sentido tão próximo a ele como naquele momento.
– Podemos conversar Senhor? Esperei tanto por este momento…
+ Claro filho podes perguntar o que quiser…
Tinha medo de abrir os olhos, sentia-me abraçado e inteiramente entregue, envolvido serenamente por uma paz que não nunca havia experimentado.
Depois daquela conversa que detalharei mais adiante nos próximos episódios, muitas coisas começaram a acontecer na minha vida e missão no Rio Tapajós. De modo natural, Deus se manifestava, inesperado e intenso para provar que tudo que havíamos conversado era verdade.
Obs: O autor é escritor, poeta, advogado e mestre em Gestão e Planejamento Ambiental.