Ex-Director do INETI (Coimbra)
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Ando a ler a obra de P. Hemenway, “O Código Secreto”, que trata de uma fórmula matemática denominada Proporção Divina que teve e tem aplicação prática em múltiplas atividades, nomeadamente arte, ciências da natureza, ciências exatas e cálculo probabilístico, com exemplos desde as civilizações Helénica e Egípcia (ex: o Pártenon na Grécia e as Pirâmides no Egito), passando pela arquitetura na Idade Média (ex: a simetria nas catedrais góticas), para descer aos nossos dias no âmbito da Botânica e Zoologia (ex: a simetria em flores e frutos e o formato do osso caracol no aparelho auditivo humano) até à época digital com o surgimento dos fractais e respetivas aplicações (ex: técnicas de diagnóstico em medicina, tecnologia de novos materiais, previsões de curto prazo em mercados bolsistas, etc). Os matemáticos usam a letra ф para representar a Proporção Divina que é uma constante resultante da expressão (1+√5)/2. Segundo Hemenway, a noção de Proporção Divina começa em cálculos efetuados na Babilónia em placas de argila, facto que revela o valor da História na apreensão de problemas atuais.
A sociologia e a política não são ciências exatas, razão pela qual é difícil prever as consequências de algumas decisões governativas. As duas guerras mundiais tiveram por base, entre outras, razões de natureza económico-financeira e, por motivos desta índole, Hitler perseguiu os judeus para confiscar os seus bens e não teve pejo em perpetrar o holocausto ou mostrar um quê de arrependimento quando teve consciência de ter perdido a guerra, matando Eva Braun e suicidando-se de seguida. Mais coragem, tiveram os líderes japoneses que, perante a rendição do Japão, praticaram o harakiri em cumprimento de um preceito cultural dos samurais, ato que leva a uma morte lenta e sofrida.
Com um fim pré-calculado, à guisa de quem esconde, nas premissas, os objetivos a alcançar, a União Europeia foi-se desviando dos caminhos que levavam, em liberdade, ao equilíbrio político e económico e social dos seus membros, objetivos que a CEE perseguia nos sonhos de J. Monnet, K. Adenauer, R. Shuman e outros.
A União Europeia está hoje cada vez mais dividida, não obstante os eurocéticos não se terem cansado de citar os inconvenientes da estratégia. A UE continua a ser uma manta de retalhos de nações, de culturas, de línguas e de interesses antagónicos, onde nunca deixou de pulsar o desejo hegemónico de alguns estados, designadamente da Alemanha.
Portugal trilha caminhos conturbados, num constante zig-zag com a Constituição da República. O CDS deixou de ser democrata cristão, o PSD deixou de ser social-democrata e o PS deixou de defender o socialismo por via democrática, factos que desfizeram a simetria política que se pretendia atingir após a derrota do “Processo Revolucionário Em Curso”, também conhecido por PREC. Hoje, vive-se não só uma crise económico-financeira, mas também uma crise de identidade, na qual os políticos constituem uma classe privilegiada, muito em especial no que se refere a benesses que começam nas juventudes partidárias e culminam num ambiente nebuloso, onde a promiscuidade de interesses embacia a transparência do ato político, longe do encanto e da harmonia que a Proporção Divina nos mostra ao longo da História. Veja-se a proposta do governo relativa à isenção de cortes nas pensões de políticos e juízes, ao jeito de quem mete uma cunha à oposição e ao Tribunal Constitucional.
Em Portugal, vive-se à luz de uma fogueira de vaidades e de interesses que desinquietam a consciência com decisões que não cabem em milhões de mentes, dado que não têm nada de Divino.