Dannie Oliveira 26 de outubro de 2010

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Sono. Traço algumas palavras e as deleto em seguida. Paro. Penso, logo …o texto não existe. Queria estar dormindo. Na minha cama. No quarto azul. Janela de vidro. Raios iluminando o chão. Cadela creme estirada sobre o tapete. Preguiçosa. Mas a vida corre lá fora, como os carros a ir e vir. Buzinas. Sol quente. Clima abafado. Céu azul. Casal de mãos dadas atravessando a rua. Velhinha sentada em frente a casa. Um gato malhado na calçada. Um menino pedala na sua bicicleta azul. Três guris correm atrás de uma pipa que rodopia desnorteada no ar.

– Olha o caminhão menino!

-Saí do meio da rua!

-Ah… Vó!

– Me dá! É minha.

– Devolve se não te bato.

Tudo normal cinco minutos depois. A mulher de cabelos castanhos mete a cara na janela para ver o movimento na rua. A garota loira desce do carro vermelho, mas não antes de dar um beijo no namorado. O adolescente de dread chama atenção ao atravessar a avenida. Carros. Motos. Um homem observa tudo de dentro do ônibus. Pessoas descem do coletivo.Cansadas. Sorrindo. Distraídas (uma menina quase cai). Pombos aproveitam o semáforo fechado para comer os pedregulhos no asfalto. Poças de lama aqui e acolá. Um urubu olha desconfiado de cima de um poste. Na árvore da esquina, mangas caem. O cheiro exala no quarteirão. Invade-me a narina. Um rato sai do buraco do bueiro e desaparece por uma fresta do velho depósito.

Televisão ligada. O diálogo da protagonista da novela ressoa pelos corredores. Fome. Pão com suco de acerola. Não tem queijo na geladeira. Tem? Atrás do pote da manteiga. Presunto? Na prateleira de cima. Pego um chocolate escondido. Minha mãe adora chocolates. A cachorra creme toma água. Seca a vasinha. Fica parada diante do portão. Abana o rabo. Late. Corre. Volta para perto de mim. O telefone toca. Não é o meu. Não é o fixo. É o do vizinho. Não atendem. Desistem. Buzinas. Freada brusca. Acidente?

– Sai do meio da rua menino!

– Bora pra casa agora! Tô mandando.

– Ah vó!

– Agora! Olha o cinturão!

Pernas apressadas cruzam o espaço estreito. Barulho de água. Meninos sorriem. Gritam. Alvoroço. Cheiro de comida. Baião de feijão verde. Com ovo ia bem. Maravilhoso. O relógio da sala dispara. Nem vi as horas. Lá fora a lua desponta no céu. Enorme. Estrelas. Vento frio. Início de noite tranqüila. Tá na hora da novela.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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