Os olhos de Luzia me perturbavam. Faziam mal. Onde quer que estivesse, sentia-me vigiado. No banheiro quando folheava minhas revistas preferidas; na intimidade do meu quarto e o pior, até nos meus sonhos.
Eram azuis, de um azul profundo. Poderiam ser bonitos não fosse a dureza de expressão. De tão ásperos, arranhavam, feriam, machucavam. Não os conseguia fitar por muito tempo.
Usava colírios especiais, protegia-os contra o sol.
Quando Luzia veio morar conosco, eu ainda não esquecera a morte da minha mãe. A presença de outra mulher em nossa casa me deixou mais triste ainda. Logo, seus olhos despertaram-me a atenção. Nunca havia visto nada tão azul. Nem o céu. Senti finda minha liberdade no momento em que me fitaram. Aquele azul me encarcerou, limitou meu mundo.
Minha vida tornou-se um inferno, azulado, mas um inferno.
Véspera de Natal. Esperávamos visitas. Antes de subir para trocar de roupas, Luzia pôs ordem na casa toda. Bom gosto e elegância marcavam a decoração, da mesa em particular. Certificou-se de que tudo estava nos devidos lugares. Eu, a um canto, procurava não ser notado, mas não consegui escapar à revista.
Chegaram os convidados. Meu pai colocou vinho nos copos. Acendi as luzes da árvore. Luzia demorava a descer.
Ouvimos um grito de dor, de desespero. Meu pai acudiu apressado, seguimos até o quarto. Caída sobre a cama, as mãos comprimindo os olhos, ela se contorcia de dor.
Alguém havia colocado ácido no vidro de colírio.
Obs: Texto extraído do livro da autora – O olho do girassol –