Por sua forte incidência cultural e social, o carnaval se tornou referência indispensável para situar o contexto de cada ano.
          Desta vez, em termos de calendário, o carnaval chega só agora, em março. Esta demora parece ter vindo a propósito, para aguardar o embarque de outros acontecimentos retardatários, que o carnaval ou vai lembrar, ou vai esquecer de propósito, como é do feitio dos foliões que procuram sempre captar o lado pitoresco da realidade, tornando-a mote de suas acrobacias artísticas.
          Pois na verdade, enquanto o país parecia esperar o carnaval, tivemos muitos acontecimentos que vão continuar fazendo parte da agenda deste ano, quer o carnaval os lembre ou os esqueça.
          Começando pelo contexto mundial, desta vez o grande terremoto não foi tanto o acontecido na Nova Zelândia, que fez sentir também lá a violência dessas convulsões do planeta, que parecem estar aumentando. O grande terremoto foi o inesperado fenômeno das manifestações de massa nos países árabes, sobretudo os situados no norte da África, de fronte ao mar Mediterrâneo. Não sabemos ainda como ficará a situação nestes países, depois de assimilados os acontecimentos destes dias. A história muitas vezes nos surpreende, e acelera o passo onde seu ritmo parecia mais lento, como parece estar acontecendo agora. Com certeza o carnaval vai ignorar esta realidade. Ela tem pouco de folclórico a oferecer. Mas muito de reflexão a deixar. Tanto mais precisaremos estar de olho na evolução dos acontecimentos na Líbia, Egito, Tunísia, Argélia, e nos outros países árabes, geralmente de forte predominância muçulmana. .
          Em termos nacionais, a tristeza dos fatos acontecidos na serra fluminense continua pesando, nos sentimentos de solidariedade com as vítimas dos deslizamentos, e na dor de consciência ao perguntar-nos pelas causas desta catástrofe. Como o carnaval do Brasil tem como primeira referência o Rio de Janeiro, fica certamente o desafio de lembrar estes fatos, para refletir sobre eles.
          Em cada ano, terminado o carnaval, se começa a quaresma, e com ela se inicia a Campanha da Fraternidade. Convidando a refletir sobre a vida no planeta, com certeza a campanha encontra na tragédia da serra fluminense motivos de reflexão e de questionamentos que nos preocupam a todos. Neste sentido, de novo a Campanha da Fraternidade vem ajudar a Igreja a sintonizar com os problemas reais que a sociedade vive, e isto acabada sendo boa oportunidade para a Igreja continuar marcando uma presença de serviço na sociedade.
          Em termos da nova administração federal, a demora do carnaval foi uma mão na roda para o governo alinhar sua equipe de trabalho, e sinalizar por onde começará a dar seus primeiros passos na direção de suas metas. Já deu para perceber o estilo de articulação silenciosa que a Presidenta Dilma está imprimindo ao seu trabalho. A definição dos seus quatro eixos estratégicos, em torno da erradicação da pobreza, da cidadania, da infra estrutura e do desenvolvimento parece indicar onde o novo governo vai concentrar sua atuação.
          Mas passado o carnaval, com certeza vai aumentar a temperatura política no país. Pois é inadiável que se abra o jogo sobre a reforma política, sobre mudanças na legislação tributária, e sobre a formulação do marco regulatório deixe clara, e viável, a parceria entre o governo e a sociedade civil organizada, especialmente em torno das políticas públicas no âmbito da educação, da saúde e da assistência social.
          Que passe logo o carnaval, e que saia da frente, pois está na hora de começar o jogo de verdade.
Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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