No imaginário das novas gerações das grandes cidades está se processando uma inversão da jornada de atividade, com maior relevo para a parte do dia que começa às 22 horas, sobretudo nos fins-de-semana. “A noite é cheia de luz” dizia com segurança uma garota à revista internacional dos Salesianos, o “Bollettino Salesiano”, editado em Roma para mais de cem edições ao redor do mundo. O fascínio da escuridão está conquistando os jovens de hoje, porque a noite é um tempo que lhes pertence inteiramente, ao invés de pertencer à sociedade, à família, às instituições, com suas regras, deveres e compromissos. Nas horas noturnas, o jovem está se sentindo livre de todas as limitações. “Quando o sol se vai, começa a minha liberdade quando ele se volta, ai de mim!” – afirmava um rapaz à citada revista. Sociólogos, psicólogos, formadores de opinião enchem as entrevistas pela televisão tentando explicar esta nova atitude da juventude de hoje. E que dizem os jovens sobre a noite, sobre sua vida noturna? Interessante entrevista realizou o citado “Bollettino Salesiano” com três jovens, de condição social, crenças e pontos-de-vista, inteiramente diversos. Vamos reproduzi-la na íntegra, denominando os jovens por letras.

1 – Que significa para você a notie? A. – Apenas o momento do dia em que não há mais sol. B. – É o momento dedicado ao repouso e aos amigos em algum lugar apropriado. C. – Ah! A noite? É o meu Dia!

2 – Por que motivo os jovens estão gostando tanto da noite e a vivem mais intensamente que o dia? A. – Quem disse isso? Não creio. De qualquer forma é certo que de dia se trabalha e à noite descansamos ou nos divertimos. B. – Penso que para alguns jovens a noite é o tempo em que eles se “desligam” e podem passar algumas horas, divertindo-se sem nenhuma preocupação. C. – À noite, me sinto livre e desimpedido, sem ninguém me julgando e me dando regras.

3 – Qual é o dia da semana mais esperado pelos jovens? A. – Qualquer um, basta que seja especial; tanto pode ser a segunda-feira como o sábado. B. – A sexta-feira, porque finalmente terminou minha semana na Universidade. C. – E ainda pergunta? É claro que é o sábado, ou melhor, a noite do sábado!

4 – De cada cem freqüentadores de locais noturnos, quantos você acredita que consumam algum tipo de droga, incluindo álcool em quantidade, ou menos naquela noite? A. – Talvez uns 70%. B. – Muitos, porque a droga é considerada como um desabafo. Talvez uns 80%. C. – Bem, eu sim, porque me faz sentir vivo. Quanto aos outros, não me interessa em nada.

5 – Noite ¿ discoteca, sexo… você acha que tenham relação estreita? A. – Não! B. – Não. Embora não fique excluída a possibilidade de acontecer. C. – Arra! Mas o senhor é um sexófobo?! De qualquer forma, isso aí é uma questão de princípios, de crenças. Mas não fique iludido, porque os jovens católicos, jovens de Igreja, também freqüentam os clubes noturnos.

6 – A noite significa para você algo proibido, tempo para transgressões de regras? A. – A noite por si só não significa para mim nada de mal, nada de errado. As pessoas que se encontram à noite são as que trabalham de dia. Quanto aos jovens, há muitas ocasiões para, à noite, “sair dos trilhos”… B. – Considero “transgressões” os excessos que normalmente eu não faria de dia. Por exemplo: fumar (eu que não fumo) ou beber além de certo limite… Mas não se pode considerar a noite apenas no aspecto de espaço para transgressões, ou para fazer coisas erradas. C. – Parece-me de dia estar com uma corda ao pescoço, vigiado por muitos olhos, hoje até eletrônicos. Deixe-nos viver em liberdade, ao menos à noite. Algumas coisas eu faço só por raiva contra a hipocrisia de uma vida cheia de transgressões, sobretudo dos mais velhos, dos adultos, que fazem escondido. É mais verdadeiro e honesto, fazer certas coisas às claras, não lhe parece?

Retornando da Assembléia Nacional da Pastoral da Juventude, em Curitiba, eu me pergunto: “E no Brasil, as coisas estão diferentes? Parece que não…”

Recife, 18/07/2004