Para a Cáritas Brasileira, esta é a Semana da Solidariedade. O motivo é simples: estamos na semana que recorda a fundação da Cáritas Brasileira, a 12 de novembro de 1956, por D. Hélder Câmara.
O lema deste ano traz a marca de D. Hélder, com a sentença pronunciada por ele: “Melhor que o pão é a sua partilha”.
Não é só uma frase de efeito. É a explicação de um milagre. A partilha faz acontecer a multiplicação do pão. Lendo com atenção o Evangelho, percebemos, de fato, que ele não fala em multiplicação, fala em partilha do pão. Da partilha nasceu a multiplicação.
O mundo está precisando com urgência de pão. Segundo a ONU, o número de famintos passou de oitocentos para novecentos e cinqüenta milhões. Mas não é que falta pão. Falta repartir melhor os alimentos guardados a sete chaves nos estoques das nações ricas. E falta uma política responsável de produção de alimentos que os torne suficientes e acessíveis a toda a população mundial.
Na verdade, se Cristo perguntasse: “quantos alimentos tendes em vossos estoques?”, ficaríamos bem mais encabulados do que os discípulos, que na verdade só tinham “cinco pães e alguns peixinhos”.
O que falta no mundo não é tanto o pão, mas sua partilha.
Foi a preocupação com a partilha, com a solidariedade, que levou D. Hélder a semear instituições, que a seu tempo frutificariam de muitas maneiras, incentivando a partilha de tantos bens. Impressiona a seqüência de lúcidas iniciativas empreendidas por D. Hélder naquela fervilhante década de cinqüenta.
Em 1952 era fundada a CNBB – a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, por articulação de D. Hélder quando ele ainda nem era bispo, e se inspirava na organização dos leigos para imaginar um organismo que articulasse a solidariedade entre os bispos. Como seria bom se hoje as instituições reencontrassem as motivações originais de sua existência!
Depois, foi a vez do CELAM em 1955, o Conselho Episcopal Latino Americano. Este organismo iria possibilitar tantas preciosas iniciativas da Igreja. Lá estava D. Hélder com D. Larrain, do Chile, tramando a fundação do CELAM, possibilitando que sua sede ficasse em Bogotá, para facilitar a articulação em nível continental.
Por fim, faltava criar a Cáritas na Igreja do Brasil E de novo D. Hélder articulou sua fundação, que culminou com a aprovação dos seus estatutos e o lançamento de suas atividades em 12 de novembro de 1956, tendo D. Hélder como seu primeiro secretário. A providência sintonizava bem com o momento vivido pelo país, que decidia construir uma nova capital para simbolizar melhor sua unidade nacional, projetando a utopia da justiça e da fraternidade entre todos os brasileiros.
Estas iniciativas revelam a lucidez e a audácia de D. Hélder. Como São Paulo, ele também podia dizer: “Segundo a graça que Deus me deu, como bom arquiteto, lancei os fundamentos. Veja agora cada um como constrói” (1Cor 3,10).
Sobre estes fundamentos somos chamados a construir. Estamos agora nos preparando para celebrar o centenário de nascimento deste grande profeta. Para homenageá-lo, nada melhor do que valorizar as grandes intuições que ele teve. A Cáritas sente o compromisso de continuar a obra lançada por D. Hélder, e fazê-la produzir muitos frutos de solidariedade.
Melhor que o pão, é a sua partilha! Incentivando a solidariedade, a Cáritas Brasileira se apresenta como instrumento do Evangelho, que nos incentiva a apostar nos sentimentos de solidariedade que Deus semeou em nossos corações, para que se multipliquem em gestos concretos de justiça e de ajuda fraterna. 07/11/2008
Obs: O autor é Bispo Emérito de Jales.