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Quando estamos na fila do banco ou do mercado, olhamos para a pessoa que está na nossa frente e quase sempre dispara em nossa mente diversos conceitos e preconceitos sobre a pessoa que nem conhecemos. Pela roupa, como fala, pela cara que aparenta. O outro sempre causa uma revolução de sentimentos e sentidos dentro de nós. Amor, ódio, medo, repulsa, desejo erótico, aconchego, paz. Sabe aquela coisa “gostei logo de cara” ou “ desde o começo não fui com a sua cara?”.

Nesse pacote ainda existem os intitulados estranhos ou esquisitos (a partir é claro, de um suposto padrão de normalidade de um determinado contexto social). Quando percebemos que somos nós esses seres “diferentões”, tentamos racionalizar dizendo que não vale a pena tentar entender quem nos julga dessa forma, ou é perda de tempo dialogar com esses filhos da ignorância.

Mas no fundo, bem lá no porão da nossa alma, temos, sim, uma questão primitiva de que precisamos nos parecer com o outro, de que o “normal” é ser o mais parecido possível com o resto da humanidade. Por que? Desde pequenos nos reconhecemos pelo olhar do outro. Nem o nosso próprio nome de nascimento podemos escolher. Inicialmente é um ser – Outro – que nos diz quem somos e é por isso que precisamos de sua aprovação constante. Posteriormente esse grande Outro se chamará sociedade e, em medidas variadas, tentaremos nos encaixar nela.

As pessoas que são vistas como esquisitas podem ser atacadas porque servem de espelho para os que desferem seus golpes. Deve-se perguntar o porquê a presença desse outro nos causa tanto incômodo. Mas ainda existe uma saída para esses marginalizados: juntarem-se às pessoas que são parecidas com elas em ser diferentes. Esses que tem os mesmos gostos, valores, práticas e peculiaridades. A internet contribuiu muito para podermos achar e juntar o grupo em que nos encaixamos.

Pronto, agora você faz parte de um grupo específico. Só o grupo importa. Você é entendido e acolhido como é. É como se você voltasse para o paraíso chamado útero materno. O psicanalista britânico Wilfred Bion diz que quando nos reunimos em grupo, criamos uma rede de realidade comum, isto é, uma mente grupal, onde emergem conteúdos conscientes e inconscientes entre os membros, e estes tendem a “viver” apenas para o grupo e em função dele. Inclusive o jogo pode virar: o grupo começa a ridicularizar quem é diferente deles. É pagar na mesma moeda o que fizeram com eles. Se alguém começa a se diferenciar desse grupo ao qual está inserido, tem uma grande chance de ser atacado ou desprezado pelo restante dos membros. Alguns teóricos dirão que esse é um processo de alienação dentro do próprio grupo.

Quem vivencia e estuda diferentes culturas sabe que a estranheza e a esquisitice estão nos olhos de quem vê e de onde mora. É como a história de um índio da tribo Jarawara e um missionário. O missionário não via sentido nenhum no que o seu amigo índio fez com o relógio de pulso dado de presente por ele. O índio amarrou imediatamente o relógio em uma árvore alta para decorá-la e achou bonito. Já em seu escritório, o missionário percebe sua contradição olhando para o seu presente dado pelo amigo: um arco e flecha que decorava sua parede. Não era usado para caçar, apenas como enfeite em seu escritório. Eles eram iguais, cada um a sua maneira.

Sinceramente acho que não podemos ser cínicos ao ponto de dizer que aceitamos todas as pessoas ou qualquer comportamento com naturalidade, sem um olhar estranho, ou um julgamento disfarçado de um sorriso falso e amarelo. Discordar é diferente de desrespeitar.

Que os grupos, cada um ao seu tempo, saiam de dentro de si mesmos para abrir uma roda de conversa num diálogo respeitoso. Pois todo ponto de vista é a vista de um ponto.

Obs: O autor é Psicólogo, palestrante, terapeuta de família casal.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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