Cheguei ao escritório nesta segunda feira, as 10h00 horas da manhã e ao ligar meu computador o primeiro pensamento foi – tenho que ir ao banco Itaú sacar o dinheiro para depositar no Bradesco para minha secretária de faxinas semanais – que prefere depósitos mensais, pois sempre diz que dinheiro na mão é vendaval.

Abro minha caixa de correio virtual e inicio a tarefa diária – apagar SPAM. Para quem não usa e-mail, são as propagandas que não solicitamos ou os benditos lixos eletrônicos aos quais não temos como impedir que cheguem até nós, principalmente porque, uma grande maioria de internautas, mergulhadores no mundo virtual, recebe alguma mensagem bonitinha de auto-ajuda, imagens fantásticas, piadinhas e filminhos que dizem valer a pena ver, e alguns valem mesmo, mas entopem nossa caixa postal, pois no momento em que vão enviar para todos de sua lista, desconhecem a ética da correspondência virtual, enviam com cópia aberta e todo mundo tem acesso ao endereço de e-mail de todo mundo. Um simples cuidado de enviar os endereços dos amigos com cópia oculta diminuiria e muito o acesso dos indesejáveis a nosso e-mail.

Na seqüência respondo os e-mails prioritários. Olho no relógio e passa do meio dia. Ai meu Deus, agora não adianta ir para o banco, pois minha gerente esta em horário de almoço e preciso aproveitar a viagem e trocar algumas idéias com ela. Sei que voltará por volta das 13h00 horas. Meia hora depois, uma amiga toca a companhia, só havia passado para deixar um beijo. Disse que estava indo para o bairro do Paraíso a pé. Eu pensei comigo, nesse sol? Nada disso, eu te deixo lá de carro, pois estou indo ao Banco. Passo pelos dois bancos, mas era desumano fazê-la esperar no carro com o calor infernal. Levo-a primeiro, voltando ao primeiro banco para sacar o dinheiro. A gerente me recebe muito bem, embora esteja cuidando há pouco tempo da minha conta e da empresa. Tornamos-nos próximas a ponto de trocarmos receitas e endereços de médicos.

Saio rapidamente, entro no carro e me dirijo ao segundo banco. Desta vez deixo o carro no estacionamento, pois nessa avenida é proibido estacionar. Sempre paro próximo perto da guarita que fica mais fácil para sair do estacionamento do banco, visualizo uma vaga logo de entrada, mas, nem sei por que, segui em frente e deixei o carro bem mais longe. Faço o trajeto todo de volta a pé, pois esse Bradesco mantém fechada a porta do estacionamento que permite a entrada na agência, talvez por facilitar aos malandros, roubos e furtos. Passo pela guarita e o senhor de cabelos brancos faz um breve comentário sobre o calor e a chuva.

Entro na área externa da agência e observo duas pessoas nos caixas de depósitos auto-atendimento, cinco caixas destinados a saque, mas somente três pessoas os mantêm ocupados. Um moço Bradesco ouve o apelo de uma moça e se dispõe a ajudá-la com um pagamento. Dois balcões altos no centro possibilitam preencher os envelopes de depósitos. Dirijo-me ao segundo, mais próximo dos caixas de depósitos e vazio. Preencho meu envelope, tiro da carteira o dinheiro e quando fecho o envelope com o lacre, me dirijo ao caixa vazio de deposito quando ouço uma voz masculina dizer: -“Perdi minha carteira”. Quem já perdeu sua carteira sabe a sensação de impotência e de frustração que abate o coração.

Estava prestes a digitar os dados necessários na máquina quando me viro e vejo um senhor de meia idade e de baixa estatura, muito calvo e com óculos pretos, próprios dos míopes, a fisionomia aflita. Ele repete: perdi minha carteira aqui, não faz muito tempo, se aproxima do balcão onde eu acabara de preencher o deposito e bate a mão aberta com força no mármore. Não foi um gesto de raiva, foi um desabafo de desespero. Todos estáticos em seus lugares observam a cena olhando para os balcões e caixa em busca da carteira.

Não me contive assistindo aquela cena e pensei – COITADO, São Longuinho, POR FAVOR, ajude esse senhor a encontrar sua carteira (nem tive tempo de pensar nos três pulinhos) o senhor veio na minha direção e disse que havia sacado dinheiro no caixa do lado onde eu estava.

Perguntei-lhe: – quando o senhor entrou aqui veio direto para esse caixa? Ele responde que não e aponta para o balcão onde estive há instantes. Coloca as mãos na cabeça que deslizam pela nuca num gesto de resignação. É como se houvesse uma pausa na cena de um filme, todos parados olhando para a vítima e somente ele se movimenta em direção à porta e lá pelo quarto passo eu o chamo:

Senhor! Aponto com meu dedo indicador… Não é a sua carteira ali no chão?

Era sim, uma carteira desgastada pelo tempo e uso, a cor era bege, que passava despercebida e se confundia um pouco com o tipo de mármore do chão. Estava caída justamente ao lado do balcão que ele foi antes de sacar dinheiro no caixa.

A expressão de alívio experimentada pelo perdedor foi tão gratificante que não me contive e falei em voz alta:
– Graças a Deus!
O senhor, sorrindo se dirigiu ao meu encontro e falou:
– Moça! Muito obrigado e que os anjos te protejam sempre.

Voltei ao escritório imaginando: destino? Coincidências de horários? Será que as 11h00 horas eu teria passado pelo mesmo acontecimento? Ou quem me atendeu prontamente foi São Longuinho?

Pode ser, pois São Longuinho nunca falhou em todos os meus pedidos. Basta citar um exemplo acontecido há mais ou menos uns 14 anos quando meu telefone de casa toca à uma hora da madrugada e uma amiga me solicitava desesperadamente que pedisse a São Longuinho para que o namorado achasse a carteira. Foram jantar fora e quando ele a deixou em casa deu por falta da carteira. Fizeram o trajeto de volta, perguntaram no restaurante e nada. Minha reação foi de riso e perguntei a ela porque não pedia diretamente? Ela afirmava seriamente que sempre quando eu pedia era atendida. E que ele estava arrasado, pois a carteira estava com cheques pré-datados de vendas de obras, dólares e cartões de crédito.

O namorado, que eu havia apresentado a ela, era um artista plástico, meu amigo de longa data, pessoa íntegra e de bom coração que convivi por muitos anos. Infelizmente faleceu em 2006. Concordei em apelar ao Santo que é conhecido por encontrar coisas perdidas.

No dia seguinte, logo cedo, ele voltou ao restaurante e refez o trajeto de onde estacionou o carro até o restaurante.

E por mais que possa parecer estranho, a carteira estava intacta caída no meio fio. Ninguém viu, ninguem pegou.

Meu querido “bendito” São Longuinho. Sem pensar e sem me preocupar onde me encontrava, dei os três pulinhos agradecendo por ter atendido meu pedido mais uma vez.

Obs: Jornalista, fotógrafa, escritora, curadora e pesquisadora cultural.
Atua hoje como assessora de comunicação nas Academia Paulista de Letras Jurídicas e Academia Cristã de Letras. Biógrafa do poeta Paulo Bomfim, é responsável pelos direitos autorais, pela obra e pelo site.

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Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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