O João-de-barro está ao lado da casa, por ele construída, em um galho do flamboiã. A minha aproximação, munido de celular, pronto para uma foto, não o assusta. Ao contrário, abre o bico para seu gorjeio, como a dizer que me oferece um quadro completo, ele, a casa e o canto. Eu consigo só a foto. Não há tempo para acionar o gravador. O sol não me ajuda. Mas, mesmo assim, altero minha posição e disparo três vezes. À tarde, com o sol nas costas, retorno para novas tentativas de captar a casa e o seu construtor. De logo, o esclarecimento: não é só uma casa, mas três, na mesma árvore, todas em galhos diferentes.
A proprietária da fazenda me garante, por tudo quanto é santo, que não concedeu nenhuma permissão, nem consta ter o João-de-barro solicitado qualquer pedido de autorização ao poder público municipal para construir, ali, nos galhos do flamboiã, três casas. Já o vaqueiro, que acompanhou alguma parte de tudo, me revela que o casal de João-de-barro, uma vez o macho, outra, a fêmea, descia e, numa área onde a chuva criou lama, o bico se enchia de lama, e, então, batia asas em direção ao flamboiã. Um ia, outro vinha, alternando-se na busca do barro, o esforço dividido no bico de cada um, sem ter essa história da fêmea ficar em casa cuidando da cozinha. Na casa do João de barro, todos trabalham. Todos, entenda-se, o casal. Não há notícias acerca da procriação, não que não ocorra, apenas esteve fora dos meus questionamentos.
Porém, nem de tudo nasce flores. O João-de-barro é um construtor que depende da chuva, para dela nascer o barro, no chão sem vegetação onde muitos trafegam e pisam. Contudo, não há como saber que, levantada a casa, a chuva, de repente, desapareça, o sol se faça presente, a fim de endurecer o barro. Nesse sentido, uma casa, já erguida em um jenipapeiro, não estava ainda solidamente segura para enfrentar a chuva, e, resultado, se desmantelou. A chuva, que enseja a lama, desajuda, quando não espera o barro endurecer. Bom seria se o João-de-barro tivesse plena consciência das condições do tempo para só construir quando a meteorología anunciar o momento exato. Aí o rabo do porco torce o rabo de vez. Complicou. Olho para um lado, para outro. O problema é do João-de-barro. Não é meu. Desisto. Volto a ler – Diário de Pernambuco, 13 e 14 de fevereiro de 2021.
Obs: Publicado no Diario de Pernambuco
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Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras