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O amor encontrou minha casa arrombada e destruída.

Passara por aqui a paixão. Chegara repentinamente, iluminando com tanta intensidade o espaço, que foi cegando os olhos de tudo.
Preencheu cada cantinho irreverentemente, expulsando hesitações, temores, cuidados e ensaios.
Nada me parecia faltar, desde então. E o próprio desejo já era satisfação, sem sequer ter sido expresso.
A beleza que a paixão produzia era tão impregnante, que eu podia admirá-la, profundamente dentro e infinitamente fora, a um só tempo.
Durou, até. Mas, num súbito, extinguiu-se e, atrás de seu rastro, restou bem pouco.

Depois, reuni forças para acender o fogo.
Comecei a catar os cacos da louça quebrada, as páginas dos escritos rasgados, evitando olhar meu rosto cansado, no espelho espatifado.
Foi, então, que o amor entrou. Não por convite. Foi o abandono que o chamou.
Quase em silêncio, pisando de mansinho, começou a tecer seu manto: um quase imperceptível afago, um olhar mais demorado, uma flor exposta num vidro vazio, uma semente a germinar.
E foi-se deixando ficar, mesmo quando parecia não estar mais aqui.
Integrou-se no leito que acolhe, nas dobras da roupa que aquece, na cadeira que apoia e na água que escorre, lava o corpo e mata a sede.

Hoje, vive no silêncio e no canto de pássaros, mesmo quando estes não vêm.
Colore o final da tarde e faz girar as pás dos moinhos distantes, que o espalham, displicentemente, mundo afora…
Diariamente o amor abre e fecha a porta, azeitando as dobradiças para que não ranjam e eu não me assuste.
Acolhe minhas inquietações, com placidez, porque sabe que vão passar.

Quando veio, o amor aceitou que eu não tivesse nada. Trouxe as mãos vazias e me alimentou de sonhos macios.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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