Lembro que na infância enrolavam panos nas quinas da mesa da sala de jantar para que eu não batesse com a cabeça nelas. Lembro de visitar lugares que hoje me parecem normais e sentir-me ameaçado pela vastidão deles. Traçava linhas imaginárias que, uma vez transpostas, me colocariam ante o misterioso e convidativo território desconhecido. Dava medo, ao mesmo tempo em que era impossível resistir aos encantos dessa jornada exploratória. Nem sabia o que queria – às vezes, até mesmo inventava motivos para avançar – mas sempre estava na caça ao tesouro.
Os lugares que visitei durante a infância hoje chegam a parecer claustrofóbicos, em novas visitas. As quinas não estão mais protegidas, muito menos está a minha cabeça, que trafega na velocidade do pensamento pelos mais sinuosos caminhos. Mas o conforto das linhas imaginárias, associado à inércia causada pelo medo do desconhecido, me faz parar de procurar. Medo de bater, ocorre. Bater, ás vezes, batemos, inclusive. No entanto, os anos passam e nem tantas coisas mudam.
Por vezes é preciso trafegar no território desconhecido pra aprender que ele é tão previsível quanto o quintal de casa. A única certeza que se tem que ter é a de que a próxima esquina pode guardar, sim, aquilo que motivava a transposição das linhas imaginárias. E isso jamais está em nosso quintal. Na época eu não sabia, mas desconfiava: um dia eu seria maior do que as paredes do quintal de casa.
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