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No mês dedicado às crianças, uma reflexão de Dom Helder Camara sobre a desigualdade na vida entre as crianças.

Meus queridos amigos

Quem já não viu crianças pequenas levando, a custo, na cabeça, latas cheias d’água — símbolo terrível de como para alguns desde cedo a vida é estranha e dura, sem ar, sem luz, sem azul…

Quando vejo mães não deixarem que a criança coma nada que caia no chão, fico pensando nas crianças que praticamente vivem de comidas apanhadas, não apenas no chão: tiradas da lata do lixo…

Quando vejo mães não gostarem que os filhinhos andem de pés descalços, porque há vermes no chão, que entram de pé adentro, penso nas crianças que não têm sapato, nem sandália, nem tamanco…

Vi uma criança pobre ser batida e quase ser levada presa, porque estava urinando ao pé do muro de uma casa rica. Será que quem bateu na criança pobre e quase a fazia seguir presa, tem ideia de que no mocambo infecto em que esta criança mora não há nem fossa?

Os dejetos humanos têm que ser jogados no primeiro recanto vazio.

Quando vejo uma criança tomando dois banhos por dia e lavando as mãos cada vez que elas se sujam, penso nas crianças sem sombra de água para banho e sem roupa alguma para mudar.

Quando penso nas crianças felizes que tem um lar de verdade, com uma mãe que é uma santa, com um pai que pode ensinar, não só com palavras, mas com o exemplo, penso em crianças que não sabem nem o nome do próprio pai. A mãe teve seis filhos, cada um de um homem diferente e nenhum mora com ela.

Quando vejo uma criança festejando o próprio aniversário, cercada de amiguinhos, que vieram cantar “Parabéns pra você” e comer bolo com guaraná, penso em crianças numerosas que nem sabem o dia em que nasceram e que nunca tiveram nem sombra de festejo de aniversário.

Roberto Carlos nos apresenta na televisão o mais belo sonho de sua vida: Ele sonha ver as crianças todas da Terra cantando juntas uma canção de amor e de paz. A canção é lindíssima. Ele começa a cantá-la com um número pequenino de crianças. Em dois tempos, a gente vê surgirem crianças de todas as raças, de todas as cores, de todos os recantos do mundo. O grupo se avoluma. É a criançada toda da terra, que canta a paz e o amor.

Deus permita que, quanto antes, se transforme em realidade o sonho que está longe de ser apenas um dos nossos cantos queridíssimos — é o mais belo sonho de milhões de criaturas do mundo inteiro! Segunda-feira, 9.2.1981

Obs: *Mais uma das crônicas escritas por Dom Helder Camara para o seu programa de rádio UM OLHAR SOBRE A CIDADE, exibido na rádio Olinda às 06h55 de 01 de abril de 1974 a 22 de abril e 1983. Está crônica está publicada no livro “Meus Queridos Amigos”, que reúne 200, das centenas de crônicas lidas por Dom Helder ao longo dos nove anos de duração do programa.

 Imagem e texto enviados pelo IDHEC – Instituto Dom Helder Camara
. Ver AUTORIZAÇÃO do IDHEC no item OBRAS LITERÁRIAS.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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