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Consciência ambiental não rima com consumismo. As crianças de hoje já estão sensibilizadas para a proteção do ambiente. Mas será que, na era do descartável, elas têm noção dos malefícios do consumo exacerbado?
É em casa que se aprende a conviver com as pressões da sociedade de consumo. Mas o estímulo e o apelo ao consumo produzem magnetismos sociais tão potentes que fica difícil convencer adolescentes e jovens de que não possuir determinados objetos e coisas não interferem em seu reconhecimento e convivência social.
Daí o nosso maior desafio: competir com as sofisticadas estratégias de propaganda e marketing pensadas exclusivamente para a venda de produtos. Isto quando nós também não somos assim considerados produtos, ou para manipular ou mesmo vender.
Os meios de comunicação, como a sociedade em geral, nos últimos anos, reconheceram a gravidade da situação do planeta. Telejornais e reportagens, destacam, incisivamente, a necessidade de mudarmos hábitos e modos de vida para contribuir com a sustentabilidade do planeta, dando-nos a impressão de que estão fazendo um trabalho de relevância social. Contraditoriamente, segundos após, apresentam as mais sofisticadas e elaboradas propagandas que nos apresentam produtos para o consumo, não estabelecendo quaisquer critérios e nem limites para consumir.
Propagandas, novelas e filmes nos vendem a promessa de que a felicidade das pessoas está nas coisas e não nelas próprias. Baseiam-se mais em valores de consumo materiais do que em valores espirituais, culturais ou artísticos.
Nossas escolas, por sua vez, há muito tempo, vêm abordando valores e conceitos que buscam a formação de uma consciência crítica do consumo e de posturas de respeito ao meio ambiente. Destacam-se os conceitos do respeito, preservação e sustentabilidade.
Mas será que estes conceitos têm alguma força para se contrapor a uma organização e estrutura de sociedade, que tem no consumo um de seus maiores pilares?
Qual é a validade das ideias, se elas não se transformam em atitudes e hábitos?
A sociedade organiza seus meios de produção, seguindo uma lógica de consumismo. Produtos são criados e lançados no intuito de nos convencer de que consumi-los é como uma condição de participar da vida em sociedade. Não consumir determinados produtos é como “estar fora de”, não participar da dinâmica da comunidade global. Daí a necessidade das propagandas, sempre bem elaboradas, criativas, dizendo sempre aquilo que desejamos ver, ouvir e saber.
O certo é que as novas gerações já têm a consciência da crise ambiental. Contudo, consciência ainda não se traduziu em atitudes e hábitos cotidianos. É que outras ideias, definitivamente, são mais fortes e decisivas. Estas ideias traduzem-se na máxima “Consumo, logo, existo”.
Na filosofia existe a máxima “Penso, logo existo”, do filósofo René Descartes, importante contraponto para inverter a lógica do consumo. No mundo consumista, mecanismo bem eficaz para operar uma venda é justamente não dar muito tempo para o “cliente” pensar, pois quem pensa mais, compra menos. Ou só compra o que é necessário.
A crise ambiental é também uma crise da humanidade e se produziu de forma criativa e engenhosa, sem perceber os limites do planeta. As grandes inovações sempre buscaram elevar a nossa qualidade de vida, mas também criaram um conjunto de necessidades que estão muito além daquilo que realmente precisamos. É por isso que consumimos muito além do que necessitamos.
É importante destacar que todo conhecimento gera compromissos. Estes compromissos já foram assumidos há muito tempo por estudiosos, líderes sociais e ambientalistas, que nem sempre foram bem compreendidos. Precisamos chegar ao limite para reconhecermos que os nossos interesses individuais – econômicos – não podem estar acima dos interesses coletivos.
O que ainda falta acontecer para que mudemos as nossas práticas de consumo a partir das nossas consciências? Até quando continuaremos atribuindo responsabilidade às crianças, adolescentes e jovens que se tornaram seres manipulados pelo sistema para sustentar um sistema social, produtivo e econômico baseado no consumismo sem freios e sem critérios?
Você já reparou que a maioria das propagandas e anúncios tem por alvos sempre as crianças, adolescentes e jovens. Por que será?
De acordo com a própria Constituição Federal, crianças devem ser preservadas de uma influência abusiva da publicidade. Deveríamos conhecer as consequências de deixar as crianças expostas à comerciais quando elas ainda não têm a maturidade para diferenciar as compras necessárias do consumismo desenfreado.
Obs: O autor é professor, escritor e ativista em direitos humanos, desde Passo Fundo, RS