Amava-o. Tanto que sempre esteve disposto a ignorar todas as suas mulheres. Aceitara continuar sendo sua sombra. Até aceitara continuar sendo homem daquela namorada que ele lhe arrumara. Eram esquetes necessários à grande encenação onde era o ator coadjuvante.
Ainda assim Pedro o traíra. Uma traição muito além daquela carne tenra, daquele sorriso de garoto que lhe fora apresentado. Era o brilho de amor que os dois trocavam. Um brilho que nunca se acendera para ele.
Deixou-os na sala. Não daria a eles o espetáculo das suas lágrimas. Lá fora a noite o abraçou. Deu-se ao choro. E caminhou até os pés se cansarem de chão, o rosto se fartar de sal, a mente voltar a se iluminar. Havia um limite para sua aceitação.
Tirou do bolso a carteirinha branca. Olhou os papelotes de cocaína. Cinco gramas de sonhos. Cinco pequenos passaportes para o granfinale. E foi pensando assim que entrou no quarto onde Pedro dormia.
No dia seguinte, vestiu-se como se fosse seu casamento. Entrou na imponente igreja disposto a manter-se sóbrio, digno, rosto sofrido, mas seco. Ignorou o desfile de óculos escuros, a falta de cores das roupas e os esparsos e surdos soluços à sua volta. Foi direto à urna que a família dele rodeava.
Olhou-o e sentiu um pequeno aperto no peito. Ao ouvir as últimas palavras do padre os olhos arderam:
– Pai, perdoe este filho. Ele não sabia o que fazia.
Chorou. Não de arrependimento. Faria novamente se necessário fosse. Chorou pela saudade que iria sentir.