Malu Nogueira 1 de junho de 2020

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Na minha infância no interior, meus passeios eram regrados: igreja aos domingos, escola na semana, visitas aos avós e, no restante do tempo, estava em casa, ajudando nos afazeres domésticos, cuidando dos irmãos menores e estudando. Não era enfadonho. Era o que eu tinha.

Tudo sob o olhar atento de uma mãe que não descuidava da educação dos filhos. Neste momento peculiarmente nostálgico, vem a minha memória, que estávamos sempre em casa, sem nervosismo, nem histeria, nem brigas. Obedecíamos aos nossos pais, sem questionamentos. Dormíamos cedo e nossa diversão eram coisas simples: bola, pular corda, esconde-esconde, desenhar, brincar com as bonecas e os meninos com carrinhos, além da leitura de bons livros, no que eu era uma voraz leitora.

Então, no meu hoje, com a pandemia do corona vírus nas ruas, faço essa releitura para encaixar o meu eu de agora, que menos vibrante, porém em eterno aprender, volta meus passos atrás e observa comovido a obra que minha mãe realizou em mim e que ainda um pouco inacabada, foge se esgueirando travessa, buscando fugir desta clausura domiciliar. Dias difíceis estes que passamos, sem tempo para curtimos nossas famílias, viajar, passear. Um confinamento imposto pelo que não vemos, mas letal, a ponto de aniquilar a todos. Sair de casa tornou-se fatal, tomar um ar fresco, ir à casa dos amigos, prosear. Nem pensar. Volto ao que escrevi no início e me amparo nos princípios educacionais que recebi: ficar em casa, para que assim, recolhidos, nos tornemos mais simples e menos individualistas e na confiança de que a normalidade retorne, nos entreguemos então, ávidos ao conforto do nosso lar, porto seguro nesta tempestade, sem sacrifício, sem escaldar o cérebro atrás de ideias disparatadas para driblar a quarentena imposta por este vírus.

Devemos, sim, vencer uma praga pior: o tempo, que me parece, pela primeira vez, ter feito pausa em todos nós.

Neste giro, uma mudança, sem ansiedade, inicia-se. O nervosismo cede lugar a algo modificador, vejo-me mais tolerante, me apraz relembrar o que as páginas da vida tinham passado. Tenho profunda satisfação de me reencontrar, esperançosa para encarar um novo amanhecer. (23.04.2020)

Obs: A autora, Maria Lucia de Araújo Nogueira, é advogada.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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