6 – Foram criados Homem e Mulher, com Dignidade e Direitos Iguais.

“Meu filho, não recuses um favor a quem dele necessita, se tu podes fazê-lo.  Não digo ao próximo: “Vai embora, volta amanhã, então te darei”, quando podes dar logo”! (Pv 3, 27)

Começamos a aceitar meninas na PAMEN em 1990, o ano do ECA. Eram principalmente as irmãs dos meninos da PAMEN que reclamavam: “E nós, não merecemos, também, uma oportunidade de participar na PAMEN”? Assim abrimos espaço para elas. A presença feminina ajudou muito no ambiente da PAMEN. Elas davam tudo de si para poder participar plenamente nas atividades. Eram um bom exemplo para os meninos.

Também descobrimos aquilo que se falava das meninas pobres e indefesas, a “violência silenciada”: abusos sofridos em silêncio, com medo de apanhar dos aliciadores, a maioria de dentro da própria família.

As vezes tivemos problemas com algumas mães  sobre isso. Algumas delas, para garantir um sustento mais seguro para a família, abriam espaço para um companheiro dentro de casa. A presença masculina poderia favorecer uma convivência melhor para a mãe, mas abria espaço para um possível abuso sexual com as filhas.

 Quando aparecia sinais do companheiro querendo se aproximar da filha, sempre aconselhávamos as mães para mandar o parceiro embora.  Poucas delas tinham a coragem de fazer isso. Algumas até cancelavam a matrícula da filha na PAMEN, para não ter mais contato conosco e correr o risco de serem denunciadas para as autoridades e o Conselho Tutelar.

 A menina que sofria tal agressão e via o apoio da mãe para o agressor, deixando ela numa situação de risco, ficava confusa e triste.  Ela, que esperava da mãe um apoio incondicional contra qualquer tipo de violência, acabava sendo acusada de algo errado, até de ser uma “Tentadora” para o agressor.

 Sempre orientávamos as meninas para gritarem quando o padrasto visitava a sua rede na calada da noite, e que nos avisassem na PAMEN para tomar as devidas providências. Tentávamos convencer as mães de não permitirem a presença do aliciador dentro do seu lar.

 Conseguimos, através desta prática, evitar o abuso sexual de várias meninas da PAMEN, quando as mães agiam como mães que amavam as filhas e tinham fé em Deus, que Ele iria prover o necessário para elas e as suas famílias, defendendo as suas filhas.

 Fomos criticados por esta prática em várias situações onde o machismo ainda prevalecia, mas continuamos constantes na Fé e confiantes em Deus. Trabalhamos para evitar que uma filha de Deus tivesse sua vida destruída por ser usada como objeto de prazer por alguém que só pensa em si e na satisfação dos seus instintos.

 Era por causa da nossa postura diante de qualquer situação que prejudicasse o bem estar de algum menino ou menina, que os pais tinham confiança em nosso trabalho. Sentiam que na PAMEN os filhos e as filhas eram bem tratados, respeitados e protegidos de qualquer perigo.  Fazemos um grande esforço para que o ambiente dos Núcleos mantinham o mesmo ambiente seguro.

As crianças e os adolescentes também sentiam esta segurança desde o início dos nossos trabalhos. Quando elas caminham para o Centro andam apressadamente. No momento que chegam e entram no portão do Centro, se percebe um alívio no rosto e até um sorriso, mostrando que consideram este lugar como espaço deles. Aqui pertencem a uma comunidade, aqui são respeitados, aqui aprendem coisas boas, aqui se sentem seguros. Este “sentir diferente” deve ser devido a presença de Deus neste lugar.

Qualquer pessoa estranha que entre nas dependências da PAMEN deve se dirigir diretamente para a secretaria e esclarecer o motivo da sua visita, onde será avaliado pela coordenação antes de permitir a sua permanência no local. A maioria das visitas é de pessoas conhecidas, de confiança, mas, de vez em quando, aparecem curiosos que entram. Esses são recebidos, esclarecem o motivo da visita, que é avaliado. De acordo com o resultado da avaliação vão poder ficar ou são acompanhados de volta para o portão.

 Muitas vezes as crianças e jovens me pedem a benção, como também para alguns educadores e educadoras. Torna-se óbvio que o ambiente criado na PAMEN é bom, fraterno e faz bem para as crianças e adolescentes. A oportunidade de estar no convívio dentro de um ambiente fraterno e feliz é o que a PAMEN oferece aos seus participantes.

É através desta nova experiência de “Bom Convívio” que as mudanças acontecem nas suas vidas; mudanças no seu comportamento, atitudes e relacionamento, que afetam também as suas famílias.

Na reunião mensal dos pais e responsáveis, estes relatam como vem acontecendo as mudanças na vida dos filhos e filhas. Ficam felizes por testemunharem esta mudança e agradecem a PAMEN por ter proporcionado um ambiente que favorece tal mudança.

As reuniões dos pais e responsáveis são bem participadas, onde comparecem mais ou menos 250 pessoas. São divididos em grupos menores para dar a oportunidade para os pais e responsáveis debaterem os assuntos em grupo e expressarem as suas opiniões.

 Um bom número dos    pais contribuem com uma doação em dinheiro para ajudar nas despesas do programa. Eles recebem um recibo e guardam este papel como se fosse algo de grande valor.  É para eles um sinal que estão ajudando a PAMEN e a caminhada dos filhos ou filhas.  Alguns doam dois reais, cinco reais, e até vinte reais tínhamos recebido..

 Nossas visitas domiciliares também ajudam a fortalecer os vínculos familiares. Com elas a equipe consegue compreender melhor a realidade da família, como ela tem que lutar diariamente para poder conseguir o necessário para sobreviver e orientar os filhos dentro de ambientes pesados, com forte tendência a violência.

Mesmo assim, dentro destes ambientes difíceis, muitas famílias, com a graça de Deus e confiança na Sua Divina Providência e o nosso acompanhamento, conseguem criar um ambiente domiciliar bom e dar uma formação melhor para os seus filhos. Muitas famílias pertencem a uma Igreja e a frequentam.

Um exemplo da importância da PAMEN na vida das crianças e adolescentes se reflete numa cartinha que uma menina de nove anos escreveu para mim:

“Irmão, gostei muito da Pastoral e do Senhor.  Quero lhe agradecer por me ter acolhida na Pastoral na hora que mais precisei. Se não fosse a Pastoral, não sei o que seria de mim”.

 Este é um exemplo de como o ambiente de amor e de valorização de cada pessoa produzem um efeito bom naquele que participa conosco.

 As meninas têm o seu dia, o sábado. Num sábado, a metade delas vem para a PAMEN, oriundas de mais ou menos 20 bairros da periferia da cidade. No sábado seguinte a outra metade, de mais ou menos 20 bairros diferentes. Geralmente participam umas 150 a 200 meninas cada sábado. São transportadas (ida e volta para casa) por um ônibus da companhia Alter do Chão, pertencente ao Salú e a Sra. Socorro, que cobram um preço solidário para a PAMEN desde o início da participação das meninas, em 1990; tem sido uma grande ajuda deles para a PAMEN.

 Aos sábados, a primeira atividade é um encontro com oito grupos de meninas, formados de acordo com a faixa etária. Durante uma hora recebem orientação baseada num texto bíblico ou algo da Campanha da Fraternidade, do ECA, ou algum problema que esteja acontecendo na cidade, ou outro assunto sobre o tema do mês.

 Por ocasião dos encontros fazem amizades, gostam de conversar entre si e com os orientadores. Crescem na coragem de dar sua opinião ou comentar sobre uma passagem bíblica ou sobre o assunto em pauta.   Depois do encontro ficam livres para escolher e participar numa atividade ou brincadeira. Algumas gostam de simplesmente conversar com membros da equipe ou entre elas. Algumas delas gostam de fazer desenhos e pintá-los; colocam mensagens e entregam para mim ou para outra educadora ou educador.

 Escrevem mensagens carinhosas: “Eu ti amo”!  “Eu confio muito em você”!  “Você é 10”!  Parece que têm uma sede de se expressar com carinho para alguém de confiança. Outras brincam jogando xadrez, dominó, cartas, pingue-pongue ou pula-pula. Algumas fazem vendas de comida ou chopinho para ajudarem nas despesas de casa ou do seu curso. Outras jogam vôlei, futebol de salão e pula corda, matar no meio ou Cricket.  Convivem com muita alegria.

 A equipe fica atenta para as meninas que ficam sozinhas sem se entrosarem com as outras. A educadora ou o educador, conversa com a menina isolada e procura incentivá-la a se entrosar numa atividade.  As vezes pede algumas meninas veteranas para se aproximarem da menina isolada e convidá-la a brincar.  Com esta metodologia, várias meninas foram ajudadas para saírem de si e irem ao encontro do outro. As famílias ficam muito agradecidas pela mudança no jeito de SER das suas filhas.

Os meninos frequentam a PAMEN nos dias da semana, 2ªf, 3ªf, 4ªf e 6ªf.  (A 5ªf é reservada para a reunião da equipe e visitas domiciliares.)

 Quando iniciamos o nosso atendimento somente com meninos, ocupamos quase todos os dias da semana: 2ªf  para os meninos de 6 a 10 anos; 3ªf e 4ªf para os de 11 a 14 anos (o maior número de meninos participantes são desta faixa etária) e 6ªf  para os meninos de 15 a 18 anos. Alcançando a idade de 18 anos, o menino (ou menina) pode terminar o ano, mas não pode mais se inscrever na PAMEN.

 Alguns meninos e meninas, ao alcançarem os 18 anos, se inscrevem para serem voluntários na PAMEN. Ao passar do tempo alguns deles se tornam educadores conosco..

 Nos seus dias de atendimento, dentre as atividades, os meninos recebem uma orientação de mais ou menos 45 minutos. Eles aproveitam bem este momento que já faz parte da nova experiência da PAMEN.

 Durante este tempo de orientação os meninos compartilham muita coisa sobre as suas vidas, do dia-a-dia nos bairros afastados da cidade. Recebem orientações dos educadores e, também, dos próprios colegas, de como lidar com certos desafios.

Durante os jogos (principalmente o futebol de salão) é proibido falar palavrão. Quando a regra é quebrada, os educadores de educação física, Carla ou Cássio, mandam o infrator ficar por cinco minutos sem jogar, sentado na beira da quadra. Uma outra estratégica é dar um ponto a mais para o time adversário quando algum jogador fala palavrão.  Assim, os próprios colegas sentem e incentivam uns aos outros para não fazerem esta infração.  Esperamos que este método vai fazer algum efeito positivo de checar as expressões não fraternas, e grosseiras.

É dada muita atenção para a disciplina nas brincadeiras; os meninos aprendem jogar numa boa sem a necessidade de falar palavrão ou fazer qualquer ato ou gesto de agressão em campo. É interessante observar como os jogos procedem com mais alegria na amizade, neste ambiente que é criado com estas atitudes mais positivas. A maneira de falar e agir é ressaltada durante as orientações, criando uma base diferente que os próprios meninos passam a colocar em prática durante o jogo.

Obs: Texto retirado do Livro do autor Pastoral do Menor, com a sua autorização.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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