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Se todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos (artigo I da Declaração Universal dos Direitos Humanos), se todo homem tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos na Declaração (artigo II), os homens, antes de mais nada, precisam de comer para viver e sobreviver.

Existem presentemente cerca de um bilhão de pessoas subnutridas no mundo. A maioria das pessoas que passam fome são mulheres e crianças. As mortes por fome, segundo dados da ONU, suplantam as mortes por sida, malária e tuberculose somadas.

A insuficiência alimentar na infância provoca danos irrecuperáveis para sempre.

Por este motivo a fome é a mais violenta negação dos direitos humanos.

Não tem coerência afirmar que todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos:
se a expectativa  média de vida nos países ricos é, em dobro ou em triplo, a expectativa média de vida em alguns países pobres;

se mesmo no seio dos países pobres, a expectativa média de vida dos ricos da população é, em dobro ou em triplo, a expectativa média de vida dos pobres da população.

Aparecem recursos para acabar com doenças transmissíveis que, nos países pobres, ameaçam, pela contaminação mundial, a saúde dos ricos da Terra.

Por que não se tomam medidas para acabar com a fome?

Por que a Humanidade terá de transpor um novo milênio carregando, nos ombros, a imoralidade e a antijuridicidade da fome?

Grande Josué de Castro, que merece estátuas modeladas em ouro, em bronze, ou simplesmente em pão, em todos os Horizontes e em todos os Continentes, inclusive na sede da ONU!

Belo profeta brasileiro que denunciou, com pioneirismo, as causas sociais da Fome.

Josué de Castro mostrou a fome como “problema social”.

Graciliano Ramos, nos seus romances, retratou a fome como problema político.  A fome não brota do céu.  A fome tem causas na terra, nas injustiças imperantes.

Josué e Graciliano sofreram exílio e prisão por dizer uma verdade tão óbvia.

No Brasil deste século, a grande figura profética, na luta contra a fome, foi o sociólogo Herbert de Souza, ou simplesmente o Betinho, como ficou carinhosamente conhecido.

A fome tem pressa, disse Betinho, com extrema racionalidade.

Condenado a morrer, Betinho lutou, até o último momento, pela vida.  Mas não tanto pela sua vida, lutou muito mais pela vida do povo brasileiro, dos marginalizados e oprimidos, dos que são massacrados pela injustiça brutal que é a fome.

Não poderia haver, na sociedade brasileira contemporânea, figura que pudesse simbolizar melhor esse grito contra a fome.

Betinho estava predestinado para ser o líder da cruzada que empunhou.

Morto Betinho, a luta deve continuar.

E deve continuar com mais vigor ainda, sob a chama da vida de Betinho, sob a inspiração deste ser humano incomum que, com muita razão, Frei Leonardo Boff proclamou como “santo”

Que se multiplique por este país, de todas as formas possíveis, o eco ao apelo que Betinho fez, em nome dos que não têm calorias nem para protestar.

A sobrevivência de sistemas democráticos está bastante ligada à construção de sociedades que eliminem a miséria.

Nessas sociedades democráticas, florescerão os direitos referidos nos dois primeiros artigos da Declaração (liberdade, igualdade, fraternidade), desaparecerão as negações de direito mencionadas em outros artigos (as discriminações em geral) e terão acolhida os demais Direitos Humanos.

A miséria não justifica o antidireito.

Nem justifica a plataforma de ditadores que dizem pretender vencer os desafios econômicos eliminando as liberdades.

A miséria degrada a condição humana.

E o faz com tanta violência que torna difícil para o miserável a luta por outros direitos que não apenas o de comer.

Obs: O autor é magistrado aposentado (ES), escritor, professor, palestrante. 
CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2197242784380520
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