Frei Adolfo Temme 15 de maio de 2020

Um homem da Syria levava seu camelo na corda,
quando de repente o animal entendeu
de estranhar e ameaçar o seu condutor.
O viajante teve que fugir correndo
e, vendo um poço, se valeu deste refúgio.
Estava caindo, mas no meio da queda
se agarrou num arbusto
que havia nascido na fresta da parede.
Quando se deu conta, a situação era esta:
Na boca do poço a cara do camelo furioso,
no fundo do mesmo um dragão com a goela aberta.
Não havia futuro: não podia subir nem descer.
Toda esperança era o pé de amora
no qual se havia agarrado.
Acontece porém que dois ratinhos,
sendo um deles preto e outro branco,
estavam roendo as raizes do arbusto,
e o dragão lá em baixo só esperando
a hora de o arbusto cair com o homem agarrado.
O coitado espiava e esperava
que um socorro viesse de algum lugar,
quando de repente viu lindas frutinhas
num galho do pé de amora.
Num instante esqueceu a cara do camelo
e a goela do dragão ameaçador
como também os ratos roedores
e dedicou-se a comer com todo gosto
a delícia que pendurava nos galhos
e com o gozo foi esquecendo
da sua triste situação.
Agora me diga quem é o fulano,
capaz de esquecer o perigo
para perder-se num gozo fugaz?
Quer saber mesmo quem é?
Este homem sou eu, és tú!
E escuta da história a lição:
O dragão da boca aberta é a morte.
O camelo que ameaça do alto
é a vida com dores e temores.
Tu és aquele que entre vida e morte
pendurado estás num galho sem valia.
Os dois que ficam roendo a raíz,
sendo um preto e outro branco,
são o dia e a noite.
Como é que entre tres ameaças
podes deliciar-se com coisa fugaz?

Tradução aproximada do alemão e a seguinte interpretação: Adolfo Temme

O humor é a maneira de encarar aquilo que costumamos negar.
Mas será que tem jeito de negar a morte que perdeu a ceremônia?
O homem entretido com gozo fugaz não é um doido.
É mesmo um sábio, é vencedor do medo, um valentão.
É isto mesmo: não despreze pequenas alegrias
e faça muita raiva ao dragão: ele vai ter que esperar.
Esta história parece pagã, mas nós podemos batizar.
A boca do dragão é aquela porta do inferno
que Jesus ao ressuscitar arrebentou.
E acabou-se a sua vitória.
Todos os que esperavam por ele
se levantaram por Sua Mão.

Obs: O autor é Frade Franciscano, nasceu na Alemanha em 1940.
Chegou ao Brasil como missionário em 1964. Depois de completar os estudos em Petrópolis atuou no Piaui e no Maranhão. Exerceu trabalhos pastorais nos anos 80 em meio a conflitos de terra. Desde 1995 vive em Teresina no RETIRO SÃO FRANCISCO onde orienta pessoas na busca da vida espiritual.   

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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