A Revolução Industrial teve início na Inglaterra, durante a metade do século XVIII, e se expandiu rapidamente por toda Europa, logo tornando-se universal. O impacto provocado pelas mudanças foi muito grande, principalmente por sua influência na transição do Feudalismo para o Capitalismo, alterando completamente o modo de vida da população. O trabalho artesanal e suas técnicas primitivas foi substituído pela divisão e mecanização do trabalho e pela submissão dos operários à gerência dos empresários, que exigiam produção cada vez maior.

Indústrias têxteis e usinas de açúcar e álcool se instalaram em todo Brasil absorvendo uma imensidão de mão de obra de baixa qualidade, procedente da agricultura. Sem currículo, os operários eram submetidos a uma jornada de 16 horas diárias, durante seis dias na semana, sem direito à previdência, licença médica remunerada e férias,  recebendo  salários insuficientes para necessidades básicas. A insalubridade física e psíquica do ambiente dava origem a insatisfações e o descontentamento estimulava alguns operários a quebrarem máquinas para interromperem a produção.

A máquina a vapor e o domínio da eletricidade foram fundamentais no início da Revolução Industrial, mas as mudanças continuam em expansão nos dias atuais com a microeletrônica, engenharia genética e a nanotecnologia prometendo, por volta do ano de 2050, a reprogramação genética e consequentemente o rejuvenescimento e a imortalidade.

Boatos de riqueza fácil atraíram muita gente para Sergipe e várias famílias vieram para cá com expectativa de alcançarem prosperidade e retornarem ricas para a Europa. Instalaram-se em Laranjeiras, Maruim, Riachuelo, Capela, São Cristóvão, Rosário, Santa Luzia do Itanhi, Estância e Itaporanga. Tornaram-se donos de indústrias têxteis, usinas de açúcar e álcool, grandes fazendas para criação de gado, bancos e  armazéns de secos e molhados que vendiam, inclusive, produtos industrializados importados da Alemanha e Inglaterra. Entretanto, a escassez de mão de obra qualificada e a falta de um programa para modernização das fábricas reduziam a produtividade, dificultando a concorrência da indústria sergipana com as do Sul. Da noite para o dia, fechavam as portas, uma a uma, deixando em cada município uma população em situação de pobreza extrema. A cidade ficava em situação deplorável, com aspecto de senzala, ruas empoeiradas, casas em ruínas e sem arrecadação, não podia atender as necessidades básicas dos moradores. Levas de desempregados, na luta para encontrar trabalho e manter a família, se transformavam em grupos nômades em peregrinação à procura de trabalho sazonal. Os nobres mantinham o brasão da família, conferido pelo Estado, símbolo de poder e passaporte que lhes garantia acesso aos cargos públicos importantes.

A evolução de Itabaiana resultou de uma combinação de fatores. É importante conhecer nossos caminhos para sabermos como chegamos aonde nos encontramos.

Agricultura

 No município de Itabaiana tudo ocorreu diferente. Sua Localização no agreste sergipano, delimitado pela zona da mata por um lado e sertão pelo outro, justifica a presença de mata atlântica e de caatinga. Na região o clima é semiárido, quente e seco, os rios são  intermitentes, o solo é raso e a vegetação de pequeno e médio porte. As chuvas irregulares e as estiagens prolongadas dificultam a produção agrícola. Tanques, cisternas, açudes e poços artesianos são reservatórios de água que ajudam a manter parte do que se planta. Entretanto, com intensa religiosidade, o itabaianense pede, em vão, a Deus, uma justa distribuição das chuvas. A indiferença divina é percebida nos longos períodos de seca, responsáveis pelo êxodo, em paus de arara, de muitos sertanejos. A terra            que nos sustenta recebe o mesmo tratamento cruel dado ao Egito.

 Diante das dificuldades, o itabaianense  vence os próprios limites e cria uma saída para cada desafio. Tornou-se conhecedor íntimo da natureza e com raízes fincadas na terra, difíceis de serem removidas, evitou participar do contingente de pessoas dependentes do trabalho nas indústrias do algodão e de cana-de-açúcar, onde a população trabalhava para a prosperidade de duas ou três famílias. Aqui, investiam no preparo da terra para agricultura, recebendo numerosos e recompensadores benefícios.

Na ausência de emprego formal, em nosso município havia uma reforma agrária em movimento permanente, sem intervenção pública ou ideológica. Quando um jovem casava, o pai dividia sua propriedade e uma pequena parte da terra era oferecida ao filho como dote. O novo agricultor aprendia a arte de escolher a terra, preparar o solo, espalhar a semente, cuidar diariamente das plantações, até o dia da colheita e de sua comercialização. Conhecendo melhor a natureza, obtinha autoconfiança e cada safra servia de incentivo para a seguinte. Esquecia de si mesmo  e exagerava no esforço de seus músculos, sistema respiratório e coração, para obter alto índice de produtividade, transformando a agricultura de subsistência em comercial e destinando o excedente ao mercado externo. Plantava batata doce, inhame, mandioca, milho, feijão, cebola e tomate, criava galinhas, alguns suínos, duas ou três vacas e construía uma casa de farinha. O município de Itabaiana passou a ser exportador de alimentos recebendo o título de Celeiro do Estado de Sergipe. Foi importante cada família  trabalhar para ela mesma e a riqueza tornava-se igualmente distribuída em pequenas propriedades.

Comércio

 O nosso código de barra, abarrotado de informações, parece que aflora logo cedo e dentre suas diversas características, a dos bons negócios é a primeira a despontar e não ser modificada pelo ambiente. As informações e mutações vantajosas passam de uma geração para outra. Os itabaianenses não medem distâncias e longe ou perto, independentemente da lei da oferta e da procura, compram e vendem por preços baixos.

Os comerciantes modernos possuem uma percepção extraordinária e com experiência adquirida ao longo do tempo, desenvolveram diversas habilidades e com aguçado sentido combinam faro, oportunidade, esperteza, flexibilidade, atenção e desembaraço para sair de qualquer areia movediça.

 A fama do comércio de Itabaiana atrai consumidores de inúmeras regiões para compras cada vez mais diversificadas. São famosas as lojas de ouro e semijoias; os armazéns de secos e molhados; as casas de ferragens e materiais de construção; as revendas de carros e peças de automóveis; as fábricas de carrocerias e esquadrias de madeira; lojas de roupas, sapatos e perfumes.          Aos sábados, no coração da cidade, ocorre a maior feira livre do Estado. A finalidade inicial era abastecer a população local, mas a evolução trouxe mudanças e a feira está mais sortida e vende de tudo: farinha, tapioca, frutas, legumes, verduras, carne fresca, pássaros e animais diversos. Tem também, sorteio de carro e motocicleta, cobra com cabeça de gente, vendedor de óleo de peixe elétrico que cura qualquer doença, cantador de viola, ciganas e mágicos. Na feira livre a transação comercial é realizada com dinheiro em espécie e às vezes é o único lugar do pequeno agricultor que sabe cuidar da terra, vender seus produtos.

Educação

 A escolarização foi fundamental na criação de uma comunidade de poucos degraus na pirâmide econômica e social. O aprendizado nos levou até o alto da montanha e nos mostrou que as melhores oportunidades profissionais são ocupadas por aqueles mais preparados, além de nos motivar a desenvolvermos nossos potenciais. E, isso foi fundamental para nossa região se tornar repleta de pessoas de alto nível educacional. Os conhecimentos adquiridos foram indispensáveis para atingirmos o auge como: professores, médicos, engenheiros, advogados, dentistas e arquitetos. Quando acendemos uma lâmpada, mesmo sem sabermos como as coisas ocorrem, a claridade emitida nos permite enxergar o que nos cerca. No entanto, é o conhecimento íntimo de cada etapa que revela nossa sabedoria. O Grupo Escolar Guilhermino Bezerra e o Colégio Murilo Braga nos prepararam para o futuro.

Os Ferreiros

 Fogo, carvão e ferro líquido em moldes, mudaram o mundo. A profissão teve origem quando o homem aprendeu a manipular e moldar os metais. A arte de forjar o ferro, o cobre e o bronze e dar-lhe forma e função evoluiu com a humanidade. Na Matapoã e nas Flexas, a profissão parecia hereditária, passando de pai para filhos e netos. Os ferreiros de Itabaiana, reza a lenda, homens determinados, cheios de magias e conhecimentos, possuíam força física exagerada, habilidade com as mãos e dons artísticos. Com fole, forja, bigorna e martelo, produziam as mais variadas peças, cada vez com maior beleza, resistência e longevidade. A fama dos ferreiros de Saracura ganhou o Nordeste e exportaram, por várias décadas: machados, foices, enxadas, facões, bigornas, picaretas, pás, martelos, dobradiças, fechaduras, tachos e lustres. Com a evolução tecnológica, o ferreiro, que muito contribuiu para nossa economia, é, hoje, uma profissão em extinção.

 Os fogueteiros

 Fogueteiro é uma profissão com risco muito elevado de acidentes e mutilações. Incêndios e explosões podem ocorrer a qualquer momento ao armazenar, manusear, transportar e comercializar pólvora ou dinamite. Várias vezes vi “com meus próprios olhos” o preparo da mistura de salitre (7,5kg) com carvão vegetal (1,5 kg), mais enxofre (1kg) para se obter 10 kg de pólvora. Os fogos de artificio possuíam valor inestimável nas comemorações juninas, pagamento de promessas e nas festas religiosas parecem fazer uma ponte entre o homem e Deus. Os fogos permanecem utilizados nas passagens de ano, vitórias na política e no futebol.

 O comércio de fogos de artifícios em Itabaiana foi por muitos anos destaque em Sergipe, interior da Bahia e Alagoas pela alta qualidade, mesmo fabricados de forma artesanal. Entre os preferidos: foguetes, busca-pés, ronqueiras, vulcões, traque, chuvinha, cobrinha, bateria e morteiros. A explosão comercial de fogos de artifícios trouxe conforto para várias famílias e divisas que contribuíram para o crescimento de Itabaiana.

Os caminhoneiros

O Brasil, mesmo dispondo de grande área territorial e extensa rede hidrográfica, não despertou para o transporte por vias férreas nem por vias navegáveis, priorizando fazer o transporte de cargas e passageiros por estradas e rodagens. Nessas circunstâncias os caminhoneiros se tornaram indispensáveis à economia do país, fazendo o reabastecimento de produtos agrícolas, industriais e combustíveis em quase todo território nacional. Na busca de bem estar para a família, os caminhoneiros fizeram contato entre Itabaiana e todo o Brasil, transportando cargas do Monte Caboraí ao Arroio Chuí e da Ponta do Seixas até a Nascente do Rio Moa. A cidade de Itabaiana, por possuir a maior densidade de caminhão por pessoa do Brasil, foi condecorada com o título de Capital Brasileira do Caminhão e todo ano, no mês de Junho, é realizada a festa do caminhoneiro, iniciada e organizada pela primeira vez por Zé de M.R. Os caminhoneiros ajudam a construir a riqueza de nossa cidade.

Quando a Europa, na época das grandes navegações, queria aroma e sabor nos alimentos à preços baixos, abriu uma rede de caminhos para Índia, que era uma grande fonte de especiarias: pimenta do reino, cravo, canela e gengibre. E, no momento em que os fidalgos europeus perceberam que o comércio da seda se tornava um negócio lucrativo, fascinados pela beleza, brilho, suntuosidade e sinais externos de riqueza e poder, que o tecido transmitia, financiaram abertura de várias rotas marítimas e terrestres para a China com a finalidade de adquirir grandes cargas de seda. As trilhas, as estradas e as rodagens para burros, cavalos, carros de boi, caminhões, trens, embarcações e aviões, são direcionadas no sentido da prosperidade. Em Sergipe, “todos os caminhos levam à Itabaiana”, inclusive os demais municípios fazem reverência à nossa cidade, sentindo-se subjugados à sua grandeza.

Somos hoje, o que herdamos de todos que nos antecederam.
Aracaju-SE, 19 de Março de 2020

Obs: O autor é médico e membro da Academia Itabaianense de Letras.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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