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Ao completar 65 anos de idade, a gente começa a pensar em si fazer algumas concessões, sobretudo em se tratando das horas de laser.

Há muitos anos tive uma vizinha que eu gostava muito, sou até hoje amiga de suas filhas, e ela, quando completou 60 anos me disse certa vez no elevador: ”agora eu  já tenho idade para fazer tudo que eu quiser. Já passei da idade de me autocensurar”. Isso foi há mais 35 anos, talvez mais. Nunca esqueci de sua alegria e jovialidade e de suas palavras.

Meu pai morreu no dia em que fez 65 anos, em consequência dos efeitos do cigarro, fumado desde criança. Poderia ter se cuidado e ter vivido bem mais. Mas não o fez.

Quando penso em mim hoje, com a idade que ele morreu e lembro como ele parecia uma pessoa bem mais velha do que era, talvez pelas questões de uma saúde negligenciada conscientemente, talvez pela mau humor facilmente desencadeado, ou talvez, simplesmente porque, há 30 anos, ter 65 anos era realmente ser velho.

Não lembro da idade que a minha vizinha faleceu. Ela já não morava mais no prédio onde minha mãe morava. Mas, com certeza, os seus 65 anos eram diferentes dos de meu pai.

E nesse clima de comemorar aniversário, coisa que adoro e não estou nem aí para aumentar os números da idade, recebi de uma amiga um vídeo belíssimo, mostrando um casal que está completando 60 as de idade, tocando piano juntos e com algumas frases que falam sobre a diferença de ser idoso e velho.

Tenho o privilégio de trabalhar em uma instituição que preserva e promove o acervo e as ideias de um homem que talvez tenha sido o idoso mais jovem que conhecemos: Dom Helder Camara. E ele dizia que “segredo de permanecer sempre jovem é ter uma causa a qual dedicar a vida”. Acredito que ele resumiu, em uma frase, o segredo da juventude. Não do corpo, mas da mente, que á a que importa.

Nesse vídeo que recebi de minha amiga, dizia que existe uma diferença entre ser idoso e ser velho e, entre outras coisas, essa diferença estaria na capacidade de continuar sonhando, na alegria de viver, na preservação da jovialidade, em estar sempre aberto a aprender, fazer planos para o futuro e achar que a vida se renova a cada dia.

Saber envelhecer é uma arte e a aceitação ou não desse processo natural é o divisor entre os jovens há mais tempo e os velhos para o resto da vida.

Tenho amigas de mais de 80 anos que não são velhas, são idosas que seguiram em frente, mantendo seus sonhos e indo em busca de realizá-los. Dom Helder, com certeza, deixou um bocado de discípulos e discípulas.

E essa aceitação começa em relação às limitações que os anos vão impondo, mas que podem ser contornadas com a alimentação saudável, exercícios, meta e objetivos a atingir e encontro com amigas e amigas. As amizades têm papel fundamental na vida de todo ser humano, pois alimentam a alma e ajudam o coração a bater melhor.

Tem coisa mais maravilhosa do que no dia do seu aniversário receber mensagens no whatsapp, Telegram, Facebook, por telefone? E os abraços pessoalmente? E as mensagens que chegam depois, mostrando que as pessoas não esqueceram de você? Momentos assim fortalecem tanto que a gente nem percebe que mais um ano foi acrescentado à nossa conta.

Ser idoso ou velho é uma questão de opção, uma escolha da forma que encaramos a vida. Podemos ganhar uma bicicleta verde e reclamar porque queria uma azul e não aproveitar o presente ou podemos ganhar um saco de sementes e imaginar que árvore linda teremos um dia.

Sempre temos escolhas. Se todas as opções são ruins escolha a menos pior.

Minha mãe, que se foi aos 90 anos, era uma mulher forte, indecisa nas pequenas coisas, mas firme nas grandes decisões. E ela me ensinou que quando a gente recebe um limão deve fazer uma limonada. Sempre procuro me lembrar disso quando os limões chegam. Nem sempre é possível, muitas vezes a vontade é jogar o limão pela janela e virar a página, mas, outras vezes, quando a limonada fica pronta, é sempre deliciosa. E aqui um alerta: há limonadas que demoram até dez anos para serem preparadas.

EM plena adolescência descobri que vivíamos em um país tomado pela repressão, violência, tortura, mortes e desaparecimentos. O final da década de 1960 e início dos anos 1970, foram os piores e mais sangrentos da ditadura. E, em meio a esse horror, eu encontrei o meu caminho: eu iria lutar, a minha vida inteira, pelo direito à liberdade.

Cinco décadas depois ainda continuo no mesmo caminho, sendo chamada de chiita, radical e coisas afins. Não me importo. Continuo a defender a liberdade, que gera vida e dignidade.

Não é fácil fazer essa opção quando vivemos em um mundo preconceituoso, que acha que quando envelhece a pessoa se torna descartável ou quando nas vagas para carros ou filas para maiores de 60 anos encontramos aquela deplorável imagem de uma pessoa acabada se apoiando em uma bengala. E aqui até faço uma proposta, vamos nos organizar e criar um movimento para que mudem aquela sinalização depreciativa para indicar os espaços especiais?

Fazendo um balanço desses 65 anos de vida, concluo, feliz, que escolhi ser idosa, jamais serei velha. Não me importam as críticas por gostar de Heavy Metal ou Rock. As pessoas velhas também não gostam de Chico Buarque e Beatles eu curto desde os tempos em que era criança/adolescente.

Tenho amigos de todas as idades, mais velhos dez ou vinte anos, mais jovens na mesma proporção e até mais. Sou meio nerd, gosto de ficção tipo Star Wars, Star Trek e super heróis. Meus preferidos são da Marvel, também desde criança. Estou percebendo que sou uma pessoa muito fiel às minhas escolhas, vejam só. Gosto de jogos de tabuleiro, vídeo Game e RPG. Não o da fisioterapia, mas o jogo, aquele onde a gente vive um personagem que cria e luta contra dragões, monstros, vampiros, alienígenas maus, enfim, aquele eterno  lance da luta do bem contra o mal.

Essa sou eu, uma pessoa que sonha e corre atrás dos sonhos, que só desiste quando não há mesmo a menor chance, que gosta de cantar, dançar, jogar e que, acima de tudo, gosta de companhia e de gente e que se desarruma inteira e sofre muito quando não consegue manter o bom senso e a harmonia em situações adversas.

Eu escolhi ser idosa. Como seria o mundo se, com o passar dos anos, apenas envelhecêssemos o corpo, mas nunca a mente?

Obs: A autora é jornalista, blogueira e Assessora de Comunicação do IDHeC – Instituto Dom Helder Camara.
Site – jornalistasweb.com.br
blogs – misturadeletras.blogspot.com.br 

jornaloporta-voz.blogspot.com.br
encontrodapartilha.blogspot.com
 institutodomhelder.blogspot.com

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Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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