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Neste ano, o car­naval co­meça cedo. Porque a qua­resma já vem che­gando, e a páscoa se anuncia para o dia 23 de março. Por isto, neste final de ja­neiro e início de fe­ve­reiro co­meça o car­naval, e já ter­mina na ma­dru­gada de quarta-feira.

Nunca de­vemos es­quecer que o car­naval é festa que morre na vés­pera. Ele é sus­ci­tado pelo longo tempo da qua­resma, como ven­tania que pre­cede a co­piosa chuva que de­pois len­ta­mente vai caindo, fe­cun­dando a terra e sus­ci­tando vida. A ven­tania pode causar re­bo­liço, ex­citar os ânimos, atra­pa­lhar os passos. O que ela não pode é nos levar de roldão, ti­rando nosso equi­lí­brio.

É bom que o car­naval venha cedo, e seja breve. Ainda mais num ano como este, com tantos de­sa­fios pela frente. Convém en­frentá-los logo, e para isto nada me­lhor do que o início pre­coce da qua­resma. Ela sim, é con­sis­tente, longa, pro­pícia à re­flexão e ao tra­balho ho­nesto e res­pon­sável. Bom seria que desta vez o es­pí­rito da qua­resma du­rasse o ano todo, se pu­dés­semos pror­rogar a ce­le­bração da Páscoa para o final do ano, de­pois de con­cluídas as muitas ta­refas que 2008 nos apre­senta.

Entre as re­mi­nis­cên­cias his­tó­ricas do seu final 8, a pri­meira que talvez mais aponte para o que nos aguarda neste ano é a nossa Cons­ti­tuição Fe­deral, apro­vada em 1988. Ela­bo­rada de­pois de um longo pe­ríodo de di­ta­dura, ela contém ga­ran­tias de­mo­crá­ticas ine­go­ciá­veis, que cons­ti­tuem seu valor maior e in­ques­ti­o­nável.

Ao mesmo tempo, feita na vés­pera das grandes trans­for­ma­ções que iriam eclodir no mundo a partir dos acon­te­ci­mentos de 1989, com o fim da guerra fria, a queda do muro de Berlim, o fra­casso do so­ci­a­lismo his­tó­rico, a nossa cons­ti­tuição não teve con­di­ções de in­tuir as re­per­cus­sões con­cretas desses acon­te­ci­mentos na vida po­lí­tica de todos os países.

Isto já deixa às claras a ne­ces­si­dade de mu­danças cons­ti­tu­ci­o­nais, sempre di­fí­ceis de fazer, pois são como ci­rur­gias de alto risco. Pre­cisam de mai­ores pre­cau­ções para serem feitas. Mas in­fe­liz­mente este cui­dado en­seja as ma­no­bras obs­ta­cu­li­za­doras, como deu para ve­ri­ficar em di­versas si­tu­a­ções re­centes, como acon­teceu no final do ano pas­sado, no epi­sódio da CPMF.

Uma das re­formas mais aguar­dadas, que en­volve no mí­nimo a re­gu­la­men­tação do dis­po­si­tivo cons­ti­tu­ci­onal que propõe di­fe­rentes formas de de­mo­cracia di­reta, é a re­forma po­lí­tica, que até hoje não foi pro­posta pelo Exe­cu­tivo, e nem as­su­mida pelo Le­gis­la­tivo. Di­fi­cil­mente terá con­di­ções de ser apro­vada neste ano, mar­cado pelas elei­ções mu­ni­ci­pais.

Este é o de­safio maior que a so­ci­e­dade bra­si­leira vai en­frentar neste ano. As elei­ções mu­ni­ci­pais serão feitas, pro­va­vel­mente, dentro dos mesmos dis­po­si­tivos elei­to­rais agora exis­tentes. Eles já com­pro­varam quanto podem abrigar ambigüidades po­lí­ticas, por falta de co­e­rência da le­gis­lação elei­toral, so­bre­tudo des­vir­tu­ando a fi­na­li­dade dos par­tidos po­lí­ticos. De­ve­riam ser os grandes ins­tru­mentos para ela­borar pro­postas ao nível na­ci­onal. Mas se re­duzem a me­ca­nismos para le­gi­timar a busca do poder local, sem com­pro­misso com um pro­jeto de nação, pro­pi­ci­ando desta ma­neira as dis­tor­ções que apa­recem com evi­dência no Con­gresso Na­ci­onal, que acaba sendo o re­sul­tante destas ambigüidades que co­meçam ao nível mu­ni­cipal. Por isto, as elei­ções serão mu­ni­ci­pais, mas sua re­per­cussão é emi­nen­te­mente na­ci­onal.

Ou­tros de­sa­fios serão ob­jetos mais freqüentes de nossas re­fle­xões. Um deles será a apli­cação prá­tica da Con­fe­rência de Apa­re­cida. Ela se cons­ti­tuiu num evento muito po­si­tivo, mas que, se não for logo in­se­rido na atu­ação da Igreja, corre o risco de perder sua força.

A Di­o­cese de Jales, com os pés no chão, ten­tará con­cluir seu pro­cesso de as­sem­bléia di­o­ce­sana, com a fi­na­li­dade exa­ta­mente de se ade­quar às pro­postas pas­to­rais e ecle­siais que Apa­re­cida apre­sentou.

Por isto, que venha logo o car­naval, e que en­tremos di­reto na qua­resma, dis­postos a buscar a graça de Deus para en­frentar bem os de­sa­fios que o ano nos apre­senta.
01.02.2008

Obs: O autor é Bispo Emérito de Jales.  

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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