Era uma vez um pequeno povoado, onde morava só gente boa e aplicada.

Trabalhavam como abelhas, eram eficientes e comportados. As crianças aprendiam com facilidade tudo que era proposto, e em breve se tornavam tão capazes como seus pais. “Gente boa”, pensou Deus. Por isso resolveu recompensá-los e prometeu de enviar – lhes uma grande Felicidade.

Talvez Deus não deveria ter feito isto, porque assim o pessoal se tornou ainda mais zeloso, e mais exemplar e mais eficiente, porque agora trabalhavam com furor. Cada um queria ser o maior, quando a Felicidade entrasse no povoado.

Havia só um pequeno problema. É que nos arredores do povoado morava uma cigana com os quatro filhos. A morada era antes uma estrebaria; não se podia chamar de casa. Era tolerada sem ninguém se comunicar com ela.

Mas agora, que Deus havia prometido a Felicidade, os cidadãos se incomodavam com os molambos da cigana, que não se exemplava com o zelo do povoado. Eram unânimes: Os ciganos devem sair do mapa! Antes do anoitecer tiveram que sair do lugar, pois a ordem era severa.

Os moradores só ficavam perguntando: Quando é que a Felicidade chega?

E agora já havia a resposta: Vai ser esta noite! “Ninguém dever dormir, porque a primeira pessoa que entrar no povoado, vai trazer a Felicidade!”

Os cidadãos ficaram de prontidão. Apagaram as luzes, atentos ao escuro. Em todas as janelas havia gente, e nas entradas do povoado havia vigias. A noite parecia não ter fim, e ninguém apareceu.

Mas de repente algo se aproximou da direção dos campos: alguma coisa chegava perto: era uma pessoa, várias pessoas, agachadas, desconfiadas.

Quando alcançaram a entrada do povoado, os sinos começaram a tocar, e todas as luzes se acenderam. E o que foi que os moradores viram? Era a cigana com seus filhos. Eles tinham voltado para buscar algum terém que tinha ficado na choupana.

“Esta é a felicidade?” perguntaram os moradores. E já que um resto de bondade havia sobrado em seus corações, acreditaram no que viram e acolheram a cigana. Seus filhos começaram a brincar com os filhos da cigana. Os adultos aprenderam dela suas cantigas estranhas e dolentes.

De noite se juntavam perto da fogueira, e os moradores deixaram por menos sua ânsia de produzir. Já não perguntavam: Quando é que Felicidade virá? Porque já estavam com ela.
Autor desconhecido

Tradução e interpretação frei Adolfo Temme

Os moradores criam seu próprio paraíso,
mas Felicidade só pode ser dom.
Auto-produzida pela disciplina,
ela alegra por um momento.
Riqueza precisa de segurança,
vigilância tira o sono,
preocupação proibe a distração,
seriedade não permite folga.
Isto é Felicidade?

Apagando todas as luzes,
os cidadãos apagam os conceitos
e perguntam: Como é mesmo a Felicidade?
Deus virá de um modo que vós não pensais.
A Felicidade já era moradora do lugar,
mas não tinha cidadania reconhecida.
Era feliz com o pouco,
zelava as tradições e criava seus filhos.
Não competia com os ideais que adoecem.
A choupana fora do povoado
virou fonte do Bem Viver.
A estrebaria fora de Belém
uniu ricos e pobres ao entrever
a glória que brilha nas palhas.

Obs: O autor é Frade Franciscano, nasceu na Alemanha em 1940.
Chegou ao Brasil como missionário em 1964. Depois de completar os estudos em Petrópolis atuou no Piaui e no Maranhão. Exerceu trabalhos pastorais nos anos 80 em meio a conflitos de terra. Desde 1995 vive em Teresina no RETIRO SÃO FRANCISCO onde orienta pessoas na busca da vida espiritual.   

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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