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“EIS QUE VOS ANUNCIO UMA BOA-NOVA  DE GRANDE ALEGRIA, QUE O SERÁ PARA TODO O POVO!” (Evangelho segundo Lucas, capítulo 2, v10)

“Quando os problemas se agigantam, è aí que os desafios se tornam apaixonantes”
(Dom Helder Camara, nosso  eterno Arcebispo de Olinda e Recife)

O Natal vem a nosso encontro num fim de ano de muitas lutas, incertezas e tristezas. Nossas vidas de família têm refletido o que acontece na sociedade, em nosso país e no mundo. Quanta gente refugiada, sem casa e sem pátria pelo mundo afora! Quanta gente desempregada, quantas pessoas caídas pelas ruas e praças sem ter aconchego nem onde dormir! Do alto dos governos se fala de reformas, daquelas que empobrecem o pobre e enriquecem o rico! Os sindicatos se enfraquecem, sem a contribuição de filiados e com trabalhadores e trabalhadoras com  cada vez mais incerteza, com horizontes cinzentos e duvidosos, sob o engano de que já não  se devem considerar “empregados/as”, mas “empreendedores/as individuais”, cada qual “patrão ou patroa” de si mesmo/a.  As florestas pegam  fogo, os povos indígenas se sentem abandonados e hostilizados . Chega-se até a dizer que “infelizmente não foram totalmente exterminados”, como se fez eficazmente nos EE UU, nossa matriz e modelo, nisso nossa imitação não chegou a ser perfeita. Temos comido e bebido mais venenos derramados pelos campos de plantação.  A gente quilombola é equiparada a animais “pesados em arroubas”  e declarada “herdeira feliz” de antepassados escravizados…  O povo nordestino  considerado merecedor de comer capim a ser distribuído em carroças pelas ruas. Não escaparam nem mesmo os observatórios de alta precisão, como os do INPE…  As Universidades navegam em ondas de incerteza e o setor da Saúde estaria perto de mudar seu nome e passar a ser chamado de “Doença”…  O povo até se assusta ao escutar falar-se sempre mais em bilhões, evidentemente resultado de uma multidão de mãos ao trabalho para ajuntar  em poucas, algumas das quais já deixaram de morar por aqui há muito tempo…  tanto no país como no mundo são pouquíssimas as pessoas que têm nas mãos a metade da riqueza . Embolando feito trapos levadas pelo vento, quase trinta milhões de pessoas  arrancadas de sua pátria, a fugir da guerra, de perseguições políticas, da falta de trabalho, muitíssimas sem achar onde pousar. Em nosso país, cada dia aumentam a insegurança e o medo da violência, em cada esquina nos espreita o perigo e a ameaça à vida , já nem se pode mais, como em outros tempos, prosear com cadeiras nas calçadas. E a tristeza que dá ao percebermos o quão  terrível a é a violência contra as mulheres pelas mãos de homens inseguros, incapazes de aceitar a nova posição de autonomia das mulheres  na sociedade… No horizonte global, o planeta está seriamente em risco de “incendiar-se” na fogueira  do chamado “aquecimento global”, no que pesem vozes contrárias fundamentadas na ignorância e no preconceito..

Infelizmente as religiões não têm exercido o papel que lhes é divido.  Ao fazerem de conta que trabalham pelo “bem das almas”, na verdade fogem covardemente da tarefa que lhes é entregue pelo Criador, de ajudar a transformar este mundo pela consciência de responsabilidade e pela ação que torna possível os gestos redentores de Deus. Que triste espetáculo ver nosso povo a correr atrás de mercenários, de curandeiros, de exploradores da credulidade pública, charlatães do sagrado! Pastores e pastoras enriquecidos pela exploração  do dinheiro dos pobres e pelo fácil acesso à amizade de ricos, em busca de riqueza e de prestígio. Que pena perceber a dificuldade de o mundo cristão, inclusive católico romano, fortalecer, apoiar e seguir a inspiração sublimemente evangélica, do Papa Francisco!

Em meio a tudo  isso, vamos tendo notícia de que até no miolo das cúpulas do Capitalismo já se começa a desconfiar de que algo está profundamente errado no sistema. Como girar muito mais em torno das finanças acumuladas do que em torno da produção? Como  dormir tranquilamente e confiar numa multidão de gentes sempre mais excluídas, “sem terra, sem teto, sem trabalho” (Papa  Francisco)? Como a longo prazo promover o sonho da “prosperidade” e operar a produção de cada vez mais gente sem pátria e excluída do sistema? Sem dúvida, é um sinal dos tempos que uma “pirralha” de dezesseis anos seja a musa encantadora da cúpula mundial de discussão dos problemas do clima. A nosso redor continua a haver gente que persiste a trabalhar com tenacidade e perseverança porque crê na humanidade e crê no Mistério que silenciosamente nos acompanha para além de todo pecado e de nossa capacidade de produzir morte. A realização do Sínodo da Panamazônia foi sem dúvida um grande momento  de respirar ar puro de esperança. Vem agora o grande encontro internacional de economistas convocado pelo Papa para fomentar a busca de um novo sistema  que seja realmente a serviço da vida, no qual a Economia (lei da casa) leve seriamente em conta a Ecologia, ou seja, a “lógica da casa comum”.

Sem dúvida, “os problemas se agigantam”, mas, ao mesmo tempo, “os desafios se  tornam apaixonantes”. Como filhos e filhas de Deus, prosseguimos no Caminho, em nossos grupos e comunidades, em nossos trabalhos e iniciativas, crescendo sempre mais coletivamente, em aliança com todo o mundo que deseja  “novo céu e nova terra”, como nos promete Apocalipse, com olhos abertos para toda iniciativa de Poder Popular, junto com os pobres e excluídos pastores da noite de Natal, com a pobre família da manjedoura…  na firme esperança de que aconteça o que nos anuncia o profeta Isaías: a criança que nos governará é o grande símbolo de que a aparente fraqueza e pequenez do Povo é, na verdade, a garantia de que um novo poder pode se estabelecer em favor dos pobres da terra (cf. Is 11). Abençoado Natal e Ano Novo de alegria e de novos compromissos, em Fé, Amor e Esperança!

Obs: O Autor é Bispo Emérito da Diocese Anglicana do Recife
Igreja Episcopal Anglicana do Brasil – IEAB….
É Teólogo e Biblista
Assessor do CEBI, de lideranças de Comunidades Eclesiais de Base e de Escolas de Fé e Política

Imagem  enviada pelo autor ( imagem da internet)

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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