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Não chovia, mas o asfalto encharcara-se e as calçadas estavam escorregadias. De olhos no chão, eu evitava o desfile sóbrio de guarda-chuvas.
– Tác!
– Moleque danado! Me assustou!
A senhora esbarrou em mim enquanto passava correndo para pegar o ônibus.
– Tác!
Eu mesma me assustei com a bombinha que estourou no meu pé; ergui a cabeça e ali estava.
No rosto rechonchudo, no sorriso infantil, no olhar arteiro. Estava ali, vivo ali.
Uma exaltação logo em frente, na rua, atraiu minha atenção. Três garotos vinham correndo, levantando pipas coloridas no céu nublado. Puxavam consigo o alaranjado esperançoso do pôr-do-sol, abrilhantando o final da tarde. Estava ali também, embrenhado em cada carretel, junto aos pés encardidos.
Mais à frente, ao portão, trancinhas e vestidos esvoaçantes roubavam flores do canteiro para enfeitar os cabelos das bonecas Estava ali também, sempre esteve!
Estava ali, em todos os cantos; em cada par de olhos, em cada risada desinibida, em cada gritinho excitado e carrinho de pipoca. Está aqui, ali, e em todo lugar. Sempre esteve e sempre estará.
Afinal, é a infância que está morta ou nossos olhos que estão fechados?