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Entra década e sai década – e agora, entra século e sai século – e o Brasil continua interpretando o patético papel de ser o eterno país do futuro. Mesmo a esquerda (?) chegando ao poder (você pode achar que ainda é cedo para se descer a lenha) parece que tudo aqui segue na base da teoria, ou melhor, do rascunho.
Rascunho que começou com a sua formação, derivada do encontro de um português fugindo de Napoleão; com um africano assustado com a mudança brusca de sua condição de vida; e com um indígena indolente e arisco diante de tanta barbárie do dito civilizado povo invasor.
Esse caótico quadro resultou, segundo Ferreira Gullar, em um povo cordial não por pura polidez ou exagerada educação, mas sim pela insegurança surgida dessa trágica união. E aí, pra copiar tudo e a todos foi só um pulinho compulsivo que nunca mais parou.
Temos, no Século XXI, um código de trânsito que, no papel (rascunho?) é uma beleza. Mas que no dia-a-dia um caos é o que impera nas ruas e estradas, provocando mutilações e mortes. Tudo isso com a brilhante atuação do álcool nesse macabro quadro, a famosa e cortejada droga institucionalizada e que é garota propaganda no horário nobre da mídia televisiva. Tem ainda a velha e esquematizada negociata de CNH, que também tem criado monstros na direção.
Possuímos um código de defesa do consumidor digno de primeiro mundo, mas que é pouco e mal utilizado por um povo que não sabe se cidadania é para comer ou passar no cabelo.
Adotamos um estatuto da criança e do adolescente tão anômalo que o jovem de até dezesseis anos pode votar, roubar e até matar, mas não pode estudar e trabalhar.
Tudo isso sem falar na Constituição de 1988 que, feito um bicho de sete cabeças, consegue ser de esquerda, de direita e liberal a um só tempo.
Já no Século XIX, Machado de Assis apontava a existência de dois brasis: o real, escuro e miserável, e o oficial, claro, mas caricato e burlesco. Tese que Ariano Suassuna corroborou no século passado e neste. E aqui está a tragédia. Enquanto esses dois brasis não se encontrarem, continuaremos sendo o país do futuro. Ou melhor, do rascunho.
Obs: O autor é Jornalista e Gestor Cultural
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