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E por falar em parcerias verdadeiras….

No tempo dos primeiros Karajá, quando eles ainda não sabiam fazer roça, nem plantar o milho cururuca, nem ananás, nem mandioca e viviam só de frutas do mato e dos bichos que matavam e pescavam, existia um casal de índios que tinha duas filhas: Kurimatutu, a mais velha e Loyuá, a mais nova.

Um dia de um amanhecer cor de urucum, Kurimatutu tomava banho no rio Araguaia, tirando o sono, quando viu brilhar, ainda mais forte que o dia, Tahiná-kan, a estrela da manhã.

– Nossa, que lindo!

E assim ficou, encantada, até Tahiná-kan sumir no céu.

Quando voltou pra casa, a cunhantã procurou seu pai e disse:

– Pai, quero namorar Tahiná-kan.

O pai, então, soltou uma risada bem gostosa e falou:

-Você não pode subir até lá, mas se ela quiser, virá te namorar.

De noite, alguém veio se deitar ao lado de Kurimatutu na esteira. No mesmo instante, a índia acordou toda a família, para mostrar que a estrela viera a seu encontro. Então, eles acenderam uma fogueira e ela viu que Tahiná-kan era um velho, enrugado e de cabelos brancos.

-Velho eu não quero! Não serve pra mim, nem pra trabalhar!

– Mas você não quis que ele viesse? – disse sua mãe – Agora que ele está aqui, você não o quer mais?

– Não serve pra mim! – gritou Kurimatutu. E foi dormir novamente.

Mas Loyuá, sua irmã mais nova, gostou do velho e quis casar com ele. Assim aconteceu e logo tiveram o primeiro filho.

Tahiná-kan era velho, mas pescava mais peixe do que qualquer jovem da aldeia Karajá. Viviam felizes.

Ocorre que, certo dia, Tahiná-kan foi até o rio Araguaia, esticou suas pernas, colocando uma em cada margem e mergulhou as mãos em forma de cuia apanhando, do fundo das águas, algumas sementes. A partir de então, todos os dias Tahiná-kan se afastava da aldeia e pedia para que Loyuá não o seguisse.

A mulher atendia ao marido, até uma vez em que Tahiná-kan demorou a voltar. Preocupada e já doida de curiosidade Loyuá foi atrás dele, pelo mato adentro.

Andou, andou muito, até que viu um jovem índio, com o corpo todo pintado e enfeitado, como usam até hoje os jovens karajá. À sua volta, um grande roçado com  muitos pés de milho, aipim, abóbora, melancia, abacaxi, urucum.

Loyuiá chamou:

– Tahiná!

E viu que era o velho, seu companheiro, que havia se transformado naquele jovem forte e bonito. Ficou feliz e voltaram para a aldeia para contar aos pais e ao filho.

Quando Kurimatutu viu Tahiná-kan daquele jeito, tão vigoroso e belo, quis ele de volta.

– Quem pediu a estrela fui eu. Ele é meu!

Tahiná-kan então falou que ele era de Loyuá, que gostara dele mesmo velho e enrugado.

Foi então que, num berro alucinante, Kurimatutu caiu no chão e se transformou no urutau, a coruja-pequena, agourenta, que até hoje grita como ela.

Passou-se muito tempo e Loyuá e Tahiná-kan viveram cada vez mais felizes, tiveram outros filhos, expandindo o costume da agricultura entre os Karajá.

Um dia, Tahiná-kan teve saudade grande do céu. Então, ele disse à mulher que precisava voltar para sua casa. Ela quis ir com ele e assim, junto com seus filhos,  eles formaram a constelação das cinco estrelas, companheira da estrela Vésper.

* (Mito Karajá, recontado pelo Daniel e pela Luzia e tornado a contar por mim.)

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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