O racismo internacional, também conhecido como Movimento Eugênico, ganhou “ares de Ciência” com Francis Galton quando, utilizando a noção mendeliana de hereditariedade e a teoria evolucionista de Darwin, passou a defender (com grande sucesso, no final do século XIX e início do XX) que as questões socioeconômicas da Inglaterra, particularmente a diferença entre as classes sociais, podiam ser explicadas pela melhor “qualidade genética” de sua elite. Rapidamente o dito “racismo científico”, utilizando-se também do Darwinismo Social (que defende a existência e naturalidade da dominação dos mais inaptos pelos mais aptos) que, como uma epidemia altamente contagiosa, tomou conta de toda “sociedade civilizada”, inclusive da maioria do meio acadêmico, passando a justificar a barbárie da exploração do homem pelo homem e muitos dos massacres e genocídios da história humana. Ainda hoje esse gigantesco e pernicioso “ovo de serpente” continua frutificando em diversos segmentos da sociedade, inclusive na implementação de políticas sociais e econômicas que aumentam exclusões e aviltam a dignidade humana. Aliás, as diferentes correntes racistas (de todas as partes do globo) sempre criam um mito para justificar seus preconceitos e práticas segregacionistas: “Arianos”, “Filhos do Sol”, “Eleitos de Deus”, “Descendentes dos Helênicos”, “Povo Escolhido”, “Supremacia Branca”, “Filhos de Odin”, “Filhos do Céu”, etc. Em verdade, essas perigosas historinhas da carochinha são inumeráveis. Até recentemente muitos chineses não aceitavam que descendiam do Homo Sapiens, mas sim de algum outro tipo de “hominídeo superior”. Entretanto, os racistas esquecem (talvez o vocábulo adequado seja “desconhecem”) que as verdades científicas são sempre provisórias. É muito mais “estar” verdade científica do que “ser” verdade científica. Olvidaram que, no Universo, tudo muda, incluindo as ditas veracidades científicas. Esta é uma das belezas da Ciência. Através do ceticismo e criticismo científico ela está sempre “se questionando” e procurando novas respostas que, por sua vez, gerarão novas maravilhosas e desafiadoras perguntas, sempre exigindo provas de qualidade (a melhor possível em determinado momento cronológico). É importante frisar que, assim como “uma andorinha só não faz verão”, apenas uma única pesquisa científica (mesmo que seja de qualidade e realizada por pesquisadores independentes e sem conflito de interesses) “não faz verdade científica provisória”. E o que nos diz atualmente a Ciência sobre a temática em tela? Vários estudos arqueológicos, linguísticos e genéticos das últimas décadas reforçam a ideia de que todos os atuais habitantes deste planeta descendem de um diminuto grupo de africanos que parecem ter sido um dos poucos grupos de hominídeos (no caso, homo sapiens) sobreviventes de alguma das inúmeras catástrofes planetárias que fazem parte da história da nossa nave mãe. E que se espalharam por todos os continentes, acerca de 60-100 mil anos, fato esse que contribuiu até mesmo para o desaparecimento de outros hominídeos, incluindo aí os nossos famosos “primos” Neandertais. O irônico nesta história é que a mesma genética (via estudos das genéticas populacionais utilizando a análise do DNA mitocondrial), que foi instrumento de argumentação racista, agora ajuda na derrubada dos mitos infantis dos racistas. Em síntese, o racismo é irmão gêmeo da ignorância e siamês do cientificismo (a perigosa pseudociência). E, infelizmente para os racistas de todos os matizes e credos, todos “vovôs e vovós ancestrais” da atual população mundial eram negros e viviam na África. Portanto, já é tempo dos racistas deixarem de serem ridículos (e merecedores de pena) e começarem a respeitar a “nossa” grande família humana e a nossa fascinante e complexa história aqui neste “grão de areia galáctico”, conhecido como planeta Terra, no beiral da linda Via Láctea, nos confins deste incomensurável e maravilhoso Universo. ps: dedicado ao senegalês Ngale Ndiaye, vendedor de bijuterias, que no dia 9/9/2015, foi vítima de racismo e xenofobia por parte de uma moradora de Londrina (PR) que, além de lhe arremessar uma banana, o agrediu fisicamente e o chamou de macaco, preto e ladrão.
Publicado no Jornal do Commercio, 24-10-2015, página 6.

Obs: O autor, Prof. Dr. Aurélio Molina, Ph.D pela University of Leeds (Inglaterra) é membro das Academias Pernambucanas de Ciências e de Medicina, professor da UPE, Coordenador do Programa Ganhe o Mundo.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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