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“Liturgia” é palavra da língua grega (leitourgía) para dizer “obra do povo e em favor do povo”. No Cristianismo, “liturgia” é designada também como “sacramento”, isto é, “sinal e instrumento” da relação entre a obra do povo e a obra de Deus em favor do povo. Ou seja, celebramos a obra de Deus que se realiza entre nós, por (através de) nós e em nós. Os gestos humanos se tornam “sinais visíveis da Graça (Deus) invisível”. Ao falar de sua possível condenação à morte em Éfeso, diz o Apóstolo São Paulo que “se meu sangue for derramado em libação, em sacrifício e serviço de vossa fé, alegro-me e me regozijo com todos vós”, isto é, sua morte ele a enxerga como solene ato litúrgico, supremo e radical (cf. Ef 2, 17). Ao recomendar a coleta entre as comunidades em favor dos pobres, designa-a como “frutos da vossa justiça” e “serviço para a glória de Deus”; chega mesmo a referir-se à coleta de dinheiro como ocasião de verdadeira celebração eucarística, o que manifesta o seu pensamento acerca da relação íntima entre economia e liturgia (cf. 2Cor 9, 6-15). Finalmente, em Rm 12, 1-2 nos diz de maneira cabal: “Exorto-vos, portanto, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos (as concretas relações quotidianas) como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, este é o vosso culto como deve ser. E não vos amoldeis (con-formeis=tomeis a forma) às estruturas do sistema deste mundo, mas transformai-vos profundamente pela renovação de vossos sentimentos, pensamentos e comportamentos, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito”. Vemos que o que legitima celebrar a Liturgia como culto, drama e ritual tão cheio de poesia é sua capacidade de revelar nosso corpo, isto é, nossas relações quotidianas entre nós (relações sociais e políticas) e com o universo inteiro (relações ecológicas), ou seja,  “nosso corpo como sacrifício vivo” em vista da transformação de nossos sentimentos, pensamentos e

comportamentos. Por isso, a Liturgia da Vida vai infinitamente além dos rituais religiosos. O Carnaval, por exemplo, é “a solene liturgia do Brasil”, como se viu no desfile da Mangueira este ano; as manifestações populares, como a que se deu em defesa da Educação no país; uma greve geral para expressar a indignação do povo com seus governantes… são todos gestos simbólicos, expressivos do “corpo do povo”, “sinais e instrumentos de nossa caminhada e de nossas lutas, “nossos corpos oferecidos em sacrifício”. Se não fosse assim, os rituais religiosos não passariam de substitutivos, gestos vazios e alienantes, “ópio do povo”… o pior é que frequentemente não passam disso e a Liturgia cristã se torna vazia e completamente ineficaz para nossa transformação vital.

Obs: O Autor é Bispo Emérito da Diocese Anglicana do Recife
Igreja Episcopal Anglicana do Brasil – IEAB….

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