A classe trabalhadora no Brasil e em muitos outros países tem sofrido duros golpes pela implementação de políticas econômicas neoliberais. Quais luzes o magistério social da Igreja Católica, particularmente do Papa Francisco, apresenta frente a essa investida avassaladora, sobretudo do capital internacional? Nesse momento difícil para a classe trabalhadora, de perdas de direitos, desemprego, aumento no percentual de trabalhadores que recebem salários abaixo do mínimo e trabalho precarizado, em muitos casos análogo à escravidão, qual deve ser o papel da Igreja?
O magistério social da Igreja, desde a Encíclica Rerum Novarum do Papa Leão XIII, de 1891, critica o liberalismo econômico, sobretudo no seu modo atual, chamado “neoliberalismo”, que absolutiza a liberdade de mercado e minimiza o papel do Estado. A Doutrina Social da Igreja, fundada sobre o princípio da primazia do trabalho sobre o capital e a primazia do bem comum sobre a propriedade privada, questiona o desequilíbrio social gerado pela acumulação de riquezas às custas de condições precárias de vida e trabalho da imensa maioria da população, e às custas, para muitos, da impossibilidade, até mesmo de de sobrevivência pela falta de emprego.
Na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, o Papa Francisco diz que “tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras” (n. 56). Nessa mesma Exortação, o Papa diz que, “enquanto não forem radicalmente solucionados os problemas dos pobres, renunciando à autonomia absoluta dos mercados e da especulação financeira e atacando as causas estruturais da desigualdade social, não se resolverão os problemas do mundo e, em definitivo, problema algum” (n. 202).
Essa realidade desafia a Igreja. Qual deve ser seu papel, especialmente no mundo do trabalho? Ela deve promover, entre os próprios trabalhadores e trabalhadoras, pesquisas participantes que os estimulem a expressar seus problemas e encontrarem-se para analisá-los, visualizando, decidindo e implementando ações comuns para solucioná-los. Essa análise, condicionada no início a questões conjunturais, deverá ser progressivamente aprofundada, para a compreensão de questões estruturais da sociedade. Por conseguinte, ações, em sua fase inicial, compreensivelmente reformistas, deverão ser potencializadas em função de transformações sistêmicas.
A Igreja deve, também, expandir sua atuação no mundo do trabalho, promovendo suas pastorais e seus movimentos de trabalhadores em novas realidades e regiões do país, garantindo articulação com outros organismos eclesiais e sociais, em torno de um plano de ação comum, com vistas a um impacto político comum de suas ações. A eficiência e a eficácia de suas ações dependerão, enfim, da conjunção de esforços na superação do conflito fundamental que perpassa nossa história, gerador de mazelas sociais, que é a superposição do capital ao trabalho, mediatizada pelo Estado que, em suma, defende o capital em detrimento do bem comum. Em 2018 e nos anos subsequentes, teremos, portanto, muito por fazer para mudar nossa história. Reavivemos nossa esperança, cultivemos nossa fé com sabedoria e tenhamos coragem em nossas ações! 15.01.18
Obs: O autor é Bispo Emérito de Jales.