Padre Beto 1 de junho de 2019

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Em um Estado totalitário, os “bombeiros” possuem a tarefa não de apagar incêndios, mas de queimar qualquer tipo de material impresso. Mas Montag, um bombeiro, começa a questionar tal linha de raciocínio quando vê uma mulher preferir ser queimada com sua vasta biblioteca ao invés de permanecer viva. Em “Fahrenheit 451”, de François Truffaut, o incêndio mais perigoso é o raciocínio, a imaginação, a inteligência.

No texto de Mc 7, 1-23, os Judeus criticam Jesus por não seguir a tradição, enquanto que Jesus exige um discernimento entre a realidade e qualquer regra do Antigo Testamento. Quando muitas pessoas me procuram com conflitos em relação às regras religiosas no que diz respeito às questões morais e outras, sempre escuto “mas na Bíblia está escrito” ou “a Igreja manda fazer assim”. Imediatamente me questiono se estas pessoas realmente conhecem Jesus Cristo presente nos Evangelhos. Afinal, Jesus procura, não somente com palavras, mas, principalmente, com atitudes, criticar uma mentalidade fanática e moralista de sua época. Diante do preceito de guardar o sábado, Jesus afirma que “o sábado foi feito para o homem, e não o homem para o sábado” (Mc 2, 27). Antes de curar um doente no sábado Jesus é questionado, pois estava para descumprir a regra, assim ele questiona se é permitido praticar o bem ou mal no sábado, salvar uma vida ou matá-la (Mc 3, 4). Por não “respeitar” a tradição era criticado por ser amigo dos publicanos e pecadores (Mt 11, 19/ Mc 2, 15-17) e por ser glutão e beberrão (Mt 11, 19). Jesus chega a citar um samaritano como exemplo em uma parábola, apesar de um sacerdote e um levita fazerem parte da mesma história (Lc 10, 30-36). Seria como eu (padre católico) citasse um umbandista ou espírita como exemplo. Jesus critica os fariseus por dar prioridade à oferta ao templo sobre o Mandamento de honrar pai e mãe (Mc 7, 9-13). Como hoje muitos pagam o dízimo para igrejas e deixam de alimentar e educar bem seus filhos ou cuidar de seus idosos. Estes exemplos, como muitos outros, mostram que Jesus, frente ao Antigo Testamento e à tradição, nos chama para a inteligência, para o discernimento entre o importante e o não importante, entre o essencial e o indiferente. Jesus combate o ritualismo legalista e o falso moralismo que visam a combinação entre um comportamento externo de acordo com as regras religiosas e uma vontade impura (Mt 23, 25-28). “Hipócritas”, diz Jesus aos religiosos de sua época, “pagais o dizimo, mas omitis a justiça, a misericórdia e a fidelidade”. Jesus nos leva a um profundo questionamento sobre o que realmente ofende a Deus. Em Mc 7, 1-8, os fariseus criticam os discípulos de Jesus por não lavarem as mãos antes de comer, como era a tradição. Seguindo o raciocínio de Jesus com certeza ele exigiria hoje que seus discípulos lavassem as mãos, não por tradição, mas por higiene, porque esta é essencial. Um pouco mais adiante (Mc 7, 15-23) esclarece que a impureza está no coração do homem e não no descumprimento de uma norma. Em outras palavras, a vontade positiva de Deus é o amor ao próximo, ao inimigo, à vida. Um amor que deve ser vivido na transparência. Certa vez, uma pessoa me procurou dizendo que faltara a missa porque havia recebido uma visita inesperada. Eu respondi que se ela havia recebido bem a visita, com verdadeira hospitalidade, esta foi a sua missa, a vivência da Palavra de Deus e a comunhão com o próximo. Outra pessoa me contou, certa vez, que estava faltando à missa porque precisa cuidar de seu esposo doente. Eu disse, com a maior tranquilidade, que cuidar de seu esposo estava sendo a sua missa diária, sua comunhão com Deus e o próximo e sua vivência da Palavra de Deus. O nosso único princípio que nos ajuda a nortear nossa vida de cristãos e a aplicar ou não uma regra religiosa é o princípio do amor à vida. Esta é a essência que Jesus nos deixou.

Este texto expressa exclusivamente a opinião do autor e foi publicado da forma como foi recebido, sem alterações pela equipe do Entrelaços.


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